Opinião

Mad Max e a Redenção dos Invisíveis

por
Douglas Ciriaco

19 de Maio de 2015
Fonte da imagem: Divulgação/Warner Bros. Pictures
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Tempo 🕐 4 min

Se eu tivesse que escolher outro nome para o quarto filme da saga Mad Max, a película seria batizada de “A Redenção dos Fodidos”. Isso porque o filme está repleto de simbologias que nos mostram que a História é escrita pelos povos inauditos e invisíveis para o poder.

Pessoalmente, acho sensacional que Max Rockatansky (Tom Hardy), talvez o personagem mais associados ao machão tradicional de toda a história do cinema, tenha se tornado coadjuvante na luta da Imperatriz Furiosa (Charlize Theron) e seu grupo de mulheres para destruir um tirano machista. Na quarta vez em que o gênio australiano George Miller roteirizou e dirigiu uma aventura de sua principal criação até hoje, ele resolveu colocar Max engrossando as fileiras de uma luta de libertação feminina.

Leia a crítica de Mad Max: Estrada da Fúria

Um deslocamento essencial para os dias em que vivemos, fazer de Max um aliado de Furiosa, mesmo que tudo tenha sido, inicialmente, apenas o resultado das circustâncias, é uma dica, o sintoma de uma reflexão mais do que necessária para todo e qualquer homem nos dias de hoje — e, claro, também nos que virão adiante.

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Miller carregou a obra de simbologia, do começo ao fim. A angulação da câmera, as tomadas, as perspectivas pelas quais o espectador vê a obra, tudo vira discurso. Quando Immortan Joe (Hugh Keays-Byrne) entra no cofre onde deveriam estar suas esposas, ele encontra apenas a parteira armada com uma escopeta. Neste momento, o espectador assume a posição do vilão, e as palavras da mulher, clamando ali o direito que cada mulher tem sobre seu próprio corpo e seu próprio destino, são direcionadas à plateia.

Adiante, quando Esplêndida (Rosie Huntington-Whiteley) entrega a mangueira d'água para Max, o enquadramento dado por Miller relaciona o ventre da moça com a água que escorre da mangueira. Semente, fertilização, fruto, futuro, esperança... Várias referências às antigas deusas dos povos nômades, aquelas apagadas da memória da humanidade pelo patriarcado.

Do micro ao macrocosmo

Em “Estrada da Fúria”, temos um microcosmo daquilo que se tornou o mundo. O planeta voltou a ser gigantesco quando o mundo de cada um dos agrupamentos humanos que se arrastam pela superfície se tornou pequeno no pós-apocalipse. A devastidão daquele pedaço do planeta reúne um pequeno exemplo de tudo aquilo que viramos.

A população desolada em busca de dias melhores (e mais molhados) tem sua esperança capturada por um tirano, que cria um exército de malucos dispostos a morrer por seu líder, acreditando que o amanhã lhes será doce no além-mundo. Nessa circunstância, Max e Nux (Nicholas Hoult), um ex-camicaze que adere à luta das mulheres após ser acolhido por Capable (Riley Keough), tornam-se aliados primeiro na sobrevivência do grupo e, depois, na destruição completa de Immortan Joe e de tudo o que ele representa.

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Mais uma vez, Miller recorre à simbologia para politizar o discurso: mulheres e homens combatem juntos o patriarcado. Por fim, o retorno do grupo triunfante à Cidadela carrega ainda mais signos: um bando de invisíveis, amputados e amputadas, gordos e gordas, deslocados da ordem, enfim, fodidos de todas as horas, festejam seu lampejo de esperança.

Max, um guerreiro solitário que aprendeu que estar ao lado das mulheres fazia parte da sua busca por redenção, perde-se em meio à multidão. Ao centro, as mulheres são celebradas pela vitória sobre o vilão. Duas bandeiras, uma vermelha e uma preta, presas atrás do veículo que o grupo chega dirigindo à Cidadela, dão cores anarquistas ao respiro de liberdade que todos ali experimentam. O povo está no poder.

Fonte das imagens: Divulgação/Warner Bros. Pictures
Douglas Ciriaco

Cê tá pensando que eu sou lóki, bicho?