Crítica Os Oito Odiados

Tarantino pinta mais uma obra de arte com sangue

por
Edelson Werlish

12 de Janeiro de 2016
Fonte da imagem: Divulgação/
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 5 min

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"Tem lugar pra mais um?", o primeiro diálogo de Os Oito Odiados, o 8º filme de Quentin Tarantino, esbanja metaliguagem e simbolismos da cena inicial e da película ao todo. Proferida por Samuel L.Jackson no papel do caçador de recompensas Major Marquis Warren, a frase dá o ponta pé na história de oito refugiados que se recluem dentro de uma loja de armarinhos durante uma grande tempestade de neve, no período pós-guerra civil norte-americano.

Logo no início, a carruagem que transporta alguns desses personagens aparece devagar pelos trotes de seus cavalos, por traz de uma cruz de madeira, na imensidão alva. A batida sonora e o ícone religioso afirmam: o destino dos protagonistas já está selado. Só podemos esperar por quem dará o tiro.

Juntam-se a Jackson no elenco principal velhos nomes da trupe tarantinesca e alguns novatos: Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Tim Roth, Bruce Dern e o clássico Michael Madsen, o Mr. Blonde de Cães de Aluguel - filme no qual o diretor traz grandes referências.Entre os créditos iniciais e a viagem da diligência rumo à cidade de Red Rock, o conto exibe uma fotografia digna de premiação, com foco nas imensas montanhas em uma tonalidade branca sem fim, musicalizada ora pela trilha clássica da lenda viva Ennio Morricone, ora pelos contemporâneos rifs de guitarra de Jack White. É um faroeste completo. 

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Podemos afirmar: Tarantino é um diretor de western. Com duas obras na bagagem, ele se consagra no rol dos grandes produtores do gênero e garante sua cadeira junto ao mestre Sergio Leone, com Morricone assinando embaixo. Ao mesmo tempo que Quentin idolatra o bangue-bangue, ele prolifera sua criatividade em um longa-metragem de época da mesma forma em que um artista pincela seu quadro em busca de uma nova pintura.

Detalhe que ele é um dos poucos nessa era que consegue pintar com sangue. E bastante sangue. Com a violência, a qual enaltece seus filmes e ainda consegue chocar uma sociedade que vive a navegar mares vermelhos, deixar sua marca registrada de coadjuvante e exibir uma estória pelas belas paisagens invernais do Wyoming, Estados Unidos, com um incrível trabalho fotográfico e sonoro, é a compra da passagem direta para o 'Saloon' divino dos diretores do gênero. 

Os Oito Odiados não foi um filme fácil de se produzir. Sofreu para sair do papel da mesma forma que a diligência de John Ruth (Kurt Russell) sofre para atravessar o estado em plena nevasca. Em 2014 ele teve seu roteiro vazado na web, o que fez o diretor cancelar as filmagens e querer publicá-lo apenas em forma de livro. Para sorte geral, depois de realizar uma leitura ao vivo da obra com seus atores em um teatro em Los Angeles, Tarantino mudou de ideia e seguiu em frente com a missão de colocar a produção nas telonas. E bota telona nisso.

O homem rodou tudo no formato 70mm, película cinematográfica que era utilizada nos anos 60 e 70 para filmar os westerns, porém que caiu em desuso ao longo do tempo. A preferência do diretor é justificável. O rolo, que possui o dobro de 35mm normalmente utilizado, proporciona ganhos consideráveis de cor e profundidade, tornando a experiência do telespectador muito maior. Uma pena não existir nenhuma sala no Brasil que comporte rodar esse modelo de bitola, mas, não deixa de firmar a película como uma ode ao cinema clássico hollywoodiano. 

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Da passagem externa para a interna, a trama se desenrola praticamente toda dentro da loja de armarinhos, um pequeno set, o qual, mesmo com a ampla câmera retangular, consegue transmitir a imensidão do filme, seja pela troca de diálogo dos atores, quanto na estrutura do roteiro não-linear. Isso mostra a evolução do trabalho do diretor, não apenas dentro do gênero, mas ao longo de suas oito obras de cinema.

Comparado ao anterior, Django Livre, de 2012, Tarantino corrige alguns pontos e retorna com algumas manias. Se em Django ele filma de forma livre, sem muito compromisso com a estrutura narrativa, em Os 8 Odiados ele retorna ao seu estilo consagrado de separar o filme em capítulos, dando uma progressão que contribui para o conto. Interessante notar como os dois parecem funcionar como dois lados opostos de um mesmo ponto histórico estadosunidense.

O anterior abordando o tema da escravidão, no sul do país, na época pré-velho oeste; e o lançamento de agora, na região norte, já no período pós-guerra civil, também pincelando a questão racial negra. Seja na função sociocultural ou na última bala do revólver, Os Oito Odiados é um grande filme western que faz jus aos seus antepassados e mostra o amadurecimento técnico de seu diretor. Esperamos o próximo; tem lugar pra mais um.

Fonte das imagens: Divulgação/

Os Oito Odiados

A oitava obra de Quentin Tarantino, com Samuel L. Jackson e Kurt Russell

Diretor: Quentin Tarantino
Duração: 185 min
Estreia: 7 / Jan / 2016
Edelson Werlish

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