Crítica do filme Divergente

Política, lutinhas e gente bonita

por
Rafael Gazzarrini

09 de Abril de 2014
Fonte da imagem: Divulgação/
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 6 min

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Antes de começar a escrever as minhas besteiras sobre o filme “Divergente”, preciso dizer que não li a obra da escritora Veronica Roth. Até pensei em pesquisar um pouco sobre o livro e me inteirar sobre a história, mas decidi que esta crítica trataria apenas do filme – acredito que assim a minha análise acaba sendo mais sincera.

Sendo assim, caso você não faça ideia do que “Divergente” aborda, eu explico rapidão. O filme se passa em um mundo destruído por uma guerra enorme e devastadora – aparentemente, em um futuro não muito distante. Para que uma época de paz pudesse ressurgir, o mundo foi dividido em cinco facções, cada uma com uma função diferente na sociedade: Abnegação (políticos e altruístas), Amizade (fazendeiros), Audácia (guerreiros), Franqueza (juízes) e Erudição (estudiosos).

A protagonista é uma garota bem lindinha, chamada Beatrice – interpretada por Shailene Woodley – que é uma Divergente, pessoa que na verdade não se encaixa em nenhuma facção e tem um cérebro diferenciado do da galera. Por conta disso, ela acaba se metendo em altas tretas políticas e sentimentais. E eu não vou explicar mais que é pra não encher o texto de spoilers.

Algo realmente inteligente

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Assim como você já deve ter imaginado pela descrição acima, “Divergente” é um filme voltado para garotas adolescentes, público no qual eu não me encaixo (sério). Por conta disso, fui ao cinema esperando uma aventura melosa cheia de beijocas, olhares nos olhos e vampiros brilhantes. Ok, essa última parte é mentira.

No entanto, eu me surpreendi com um universo fantasioso bem inteligente. Essa sociedade alternativa retratada pelo filme trata de vários aspectos políticos que têm paralelo com a vida real, por assim dizer. Isso faz com que a pessoa na frente da telona comece a pensar sobre diversas coisas, algo que eu não esperava em um romance adolescente.

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Para começar, essa divisão por facções é um instrumento de segmentação e status bem eficiente. Todos têm um papel útil na sociedade, mas há claramente aqueles com maior poder, como os Eruditos que “sabem de tudo” ou os Francos que são “responsáveis pela verdade”. Uma escolha mais sincera, condizente com as suas vontades e personalidade, pode colocar você em uma posição ruim, simplesmente por ser simples.

Em nosso mundão, a profissão que você escolhe e a carreira que você constrói se tornam a totalidade daquilo que você é; algo muito alienador, limitador e exasperante para a grande maioria das pessoas. Além da separação por castas, “Divergente” mostra esse discurso reducionista com a frase “Facção antes do Sangue”, de modo que a protagonista não pode nem mesmo ter contato com a sua família depois de mudar de grupinho.

É lógico que a produção mostra algo extremo, mas é de se pensar a maneira como a nossa vida é encaixada (ou moldada) dentro da sociedade, não é mesmo?

Só mais um pouquinho de política, eu juro

Outro paralelo bem colocado pelo filme é a utilização de mendigos. O pessoal retratado como o grupo dos bostões são os sem facção, pessoas que não conseguiram se adequar a um determinado segmento da sociedade. Sem trabalho, eles são colocados como nada, como um ninguém, com a única alternativa de vagar pelas ruas, sujos e esfolados.

No fim das contas, na nossa realidade, os mendigos são isso mesmo. Um ninguém ou um nada. Alguém sem papel, alguém inútil. Isso me fez pensar em quão injusto é o tratamento que essas pessoas recebem, porque elas talvez apenas não tenham se encaixado em algum lugar ou não tenham tido a oportunidade de se mostrar, de encontrar o próprio lugar ou até mesmo de se conhecer.

Por conta disso, eu repito: me surpreendi, pois simplesmente não esperava encontrar esse tipo de relação em um romance adolescente. E isso foi bem bacana.

O de sempre e alguns tropeços

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Agora, voltando à programação normal, vou falar de outros aspectos. Algo que me agradou é o que filme é bem fluído em grande parte do tempo, de modo que o primeiro livro de Roth é contado do começo ao fim. Isso nos faz entender bem a ideia que a autora quer passar, sem nos prender em muita melação ou em dilemas juvenis enjoativos – algo que vai agradar até mesmo os espectadores adolescentes.

As cenas de ação são muito bem feitas, assim como os efeitos visuais e caracterização dos personagens – a sociedade é um grupo Power Ranger gigante, cada facção usa uma cor. Apesar de tudo isso, há alguns tropeços que deixam a narrativa truncada em alguns momentos ou até mesmo superficial.

Um exemplo é (SPOILER, SPOILER) a morte dos pais de Beatrice. Os dois falecem em cerca de 5 minutos, sendo que tudo isso acaba sendo muito raso e sem sentimento. Porra, a guria ficou órfã, cacete, deviam ter investido em cenas mais profundas ou algo deste tipo. Há também momentos de romance sem sentido, como quando o casal protagonista se toca e a garota faz cara de ‘CARALHO, ELE TÁ PEGANDO NAS MINHAS COSTAS, GENTE’. É chato e dispensável, simples assim.

Se você é uma pessoa que gosta de tudo respondido nos mínimos detalhes, é provável que se irrite em diferentes momentos da história. Afinal de contas, que guerra é essa que acabou com o mundo? Qual a diferença do cérebro dos Divergentes? O que aquela cerca de antenas gigantes faz? No fim das contas, é possível que essas questões sejam respondidas apenas com a leitura do livro.

E isso quer dizer que...

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Levando em consideração todos esses aspectos, “Divergente” é sim um filme para garotas adolescentes, mas que pode agradar diferentes tipos de pessoas, principalmente as dispostas a pensar um pouco mais sobre o enredo mostrado e que gostam de aventuras com tiros, lutinhas e pulos. Contudo, você não vai escapar de clichês, de romance jovem e até mesmo de momentos simplesmente superficiais – mas isso já era de se esperar, não é, leitor lindão?

Um bônus é o fato de que tem um monte de gente tatuada, o que é muito legal, na minha opinião, mesmo que os desenhos sejam meio escrotos e pareçam ter saído de algum pacote de bala.

Fonte das imagens: Divulgação/
Rafael Gazzarrini

Pode me chamar de Rafa, eu ando por aí na minha nuvem dourada.