Crítica do filme Fogo no Mar

O retrato histórico da crise migratória

por
Nicole Lopes

25 de Outubro de 2016
Fonte da imagem: Divulgação/Imovision
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 3 min

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Lampedusa, situada no meio do Mediterrâneo, poderia ser apenas mais uma ilha paradisíaca apinhada de turistas, atraídos pelas águas límpidas e pelo cotidiano pacato dos moradores do local. O destino, porém, encontra-se entre dois contextos opostos.

Com pouco mais de 20 quilômetros quadrados de extensão, a ilha italiana é uma das linhas de frente na crise migratória da Europa, sendo um ponto de chegada para refugiados de diversos países da África e Oriente Médio. E é essa dicotomia que o documentário “Fogo no Mar”, dirigido por Gianfranco Rosi, expõe.

Ganhador do Festival de Berlim e indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, o filme foi escolhido para abrir, na última quinta-feira (20) a programação do Festival Cinema da Bienal Internacional de Curitiba, evento que acontece na capital até o dia 28 de outubro.

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Por meio de várias narrativas independentes entre si, o documentário mostra a rotina dos habitantes e recém-chegados em Lampedusa, tendo como um dos protagonistas o menino Samuele Caruana, de 12 anos, e sua família de pescadores.

O garoto leva uma vida com certo ar de descolamento da experimentada no cenário urbano tradicional deste século. Vemos Samuele brincando com seu estilingue, correndo pelas ruas, muitas vezes só.

No mar, o menino encontra ora instantes de reflexão e observação, ora momentos de aprendizado sobre a pesca, que vê como sua fonte de subsistência assim como foi de toda a sua família.

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A realidade de Samuele, no entanto, é permeada por influências do contexto da chegada de refugiados. Ansioso e excessivamente preocupado para uma criança, não ignora a presença das dezenas de barcos de resgate que participam do cenário de seu dia-a-dia, por exemplo. 

As cenas do menino são entrecortadas, sem nenhuma ligação explícita, por imagens das operações de resgate e acolhimento de refugiados. Rossi optou por não economizar na exposição da realidade, mostrando longamente olhares, lágrimas, enfermos e cadáveres. 

Como elo entre os estrangeiros e os nativos encontra-se o médico Pietro Bartolo, que em seu trabalho lança um olhar individualizado a cada um dos imigrantes que atende. A postura causa questionamento da maneira generalista como o mundo trata a questão, explorada pelo documentário com cenas que colocam os migrantes como parte de uma massa, um todo sem rosto nem voz - que é tudo o que eles não são.

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Apesar de as histórias serem contadas de maneira paralela, todos os personagens têm algo em comum: o mar tem um papel primordial nas trajetórias. É o mar, inclusive, um dos responsáveis para o alto padrão estético da montagem.

O movimento, a cor e o bucolismo da água dão o tom do filme, causando algum tipo de despertar sobre o contraste entre as experiências mais belas e mais terríveis do mundo.

Talvez o valor mais importante de “Fogo no Mar” seja a humanização da migração, que tira o caráter meramente bélico que os números aos milhares – seja de mortos, seja de sobreviventes – conferem à circunstância, para quem acompanha de longe. 

*Cecília Tümler especial para o Café com Filme.

Fonte das imagens: Divulgação/Imovision

Fogo no Mar

O retrato histórico da crise migratória

Diretor: Gianfranco Rosi
Duração: 108 min
Estreia: 28 / Apr / 2016
Nicole Lopes

À procura do mundo invertido