Crítica do filme Roma

O retorno à infância de Alfonso Cuarón

por
Nicole Lopes

03 de Fevereiro de 2019
Fonte da imagem: Divulgação/Netflix
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 4 min

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Um filme em preto e branco, luz e sombra.  É ótima a forma que Alfonso Cuarón optou para retornar às raízes da sua infância no filme "Roma" (2018), o longa da Netflix que deu no que falar nos festivais de Cannes e Veneza, bem como no Globo de Ouro.

Promovido da simplicidade e todo o poder da imagem do cinema moderno dos anos 1960, Cuarón conta a história de Cleo (Yalitza Aparicio), empregada doméstica de uma família de classe média do bairro Colônia Roma, no turbulento Distrito Federal do México nos anos 70, que vivia a tensão política no governo de Luís Echeverría.

Em um período de um ano surgem acontecimentos inesperados que começam afetar a sua vida e da família para quem trabalha. A angústia de uma paixão que chegou ao fim, o abandono familiar que tornou-se presente no cotidiano e todo o processo de cura.

Apesar de ser um filme de drama familiar, Alfonso Cuarón, diretor e roteirista de "Roma", põe o seu olhar cuidadoso e sincero para construir um relato singelo dos conflitos domésticos e de hierarquia social vividos por sua babá, tornando o filme uma homenagem carinhosa às mulheres que o criaram. 

Uma história para se identificar

Nessa abordagem intrínseca, o filme retrata a rotina massante e mecânica de Cleo em cuidar das tarefas domésticas e das crianças, que na ausência do pai e da mãe, criam um afeto amoroso por ela. Em contrapartida, Cleo vive o descaso do parceiro amoroso que não assume a paternidade do filho que está a caminho.

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Sem dar lições de moral, o filme evidencia as mudanças individuais e coletivas de cada personagem. Assim como a Sra. Sofía (Marina de Tavira,  que está indicada ao Oscar pelo papel), patroa de Cleo e matriarca da família, que vive a solidão de um fim de relacionamento em que há raiva, desespero, tristeza e conformação, a empregada doméstica de origem indígena sente o peso da vida e toda a sua ingenuidade sendo destruída. 

Nesse meio tempo em que duas mulheres vivem problemas semelhantes, "Roma" não se isenta dos fatos sociais que estão presente no lado de fora do portão de casa. O diretor conduz o telespectador a entender como de fato a tensão política, as revoluções populares e reivindicação de terras afetam a vida de todos, seja de forma indireta ou direta.

Uma imagem vale mais que mil palavras

Assim como nos filmes de Hitchcock, que trazem toda a plasticidade da composição de luz e sombra para montar a estética e transmitir uma ideia, "Roma" trabalha toda a composição e essência da imagem para dar significado e sentido ao roteiro. 

Sem fazer o uso de recursos apelativos como trilha sonora e vários planos em uma cena, Cuarón emprega o som ambiente e  câmera opaca para criar uma poesia em forma de imagem e permite que ela mesma conte a realidade e a história que está sendo abordada, sem necessariamente deixar explícitas todas as informações.

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Por meio desta linguagem, o filme torna o telespectador um observador da história com autonomia de interpretar os acontecimentos apresentados. Repleto de preocupação na direção de fotografia e iluminação, "Roma" também  surpreende na montagem rítmica e tonal. 

Considerado um dos filmes mais esperados de 2018, o longa disputa 10 indicações ao Oscar 2019, incluindo de melhor filme e melhor filme estrangeiro. Com uma atuação louvável, a jovem atriz indígena Yalitza Aparecio, também concorre na premiação como melhor atriz e traz toda a essência da sua origem para o cinema. 

Não há dúvidas que Alfonso Cuarón utilizou de toda a sua bagagem de lembranças e repertório artístico para dar vida a "Roma", um filme feito para treinar e sensibilizar o olhar e a vida.

Fonte das imagens: Divulgação/Netflix

Roma (2018)

Crônica familiar...

Diretor: Alfonso Cuarón
Duração: 135 min
Estreia: 21 / Nov / 2018
Nicole Lopes

À procura do mundo invertido