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Crítica do filme Looney Tunes - O Dia Que A Terra Explodiu | Voltando às loucas origens e entregando diversão para todos

Looney Tunes - O Dia Que A Terra Explodiu é uma explosão (com o perdão do trocadilho) de nostalgia e irreverência que acerta em cheio na proposta: resgatar o humor anárquico que tornou os personagens da Warner Bros. tão icônicos. Gaguinho e Patolino, que já dividem as telinhas desde a década de 1930 — mais antigos até que o próprio Pernalonga —, ganham aqui uma improvável, mas divertida, história de origem.

Essa ideia, ainda que não precise ser encarada como definitiva (afinal, Looney Tunes sempre brincou com linhas do tempo e realidades), é criativa e oferece um novo olhar sobre uma das duplas mais carismáticas da animação. Mesmo com toda essa ousadia, alguns fãs podem sentir falta de um ingrediente essencial: Pernalonga. Sua ausência é sentida, especialmente por aqueles que o veem como o grande símbolo dos Looney Tunes.

Ainda assim, o filme se sustenta com maestria, graças ao carisma inegável de Gaguinho e às loucuras audaciosas de Patolino, bem como ao roteiro que sabe explorar tanto o absurdo quanto temas surpreendentemente maduros, como mercado de trabalho, vida adulta e laços afetivos. Tudo, é claro, com o humor característico da franquia.

Desenho, Doideira e Nostalgia

Visualmente, o filme aposta no tradicional e acerta. Nada de versões 3D aqui: o desenho é no bom e velho estilo cartunesco, com um colorido vibrante e perspectivas ousadas que, vez ou outra, até sugerem uma leve tridimensionalidade — sem abandonar o charme dos traços clássicos.

A estética de Looney Tunes - O Dia Que A Terra Explodiu carrega exageros visuais que se alinham perfeitamente ao espírito dos Looney Tunes, como cenas com ângulos esticados, explosões sem sentido e reações absurdamente físicas que só funcionam mesmo dentro desse universo animado.

looneytunesodiaqueaterraexplodiu01 283f2Fonte: Divulgação/Warner Bros.

O humor é um dos pontos altos. Cheio de referências contemporâneas, o roteiro zomba de tudo: desde o excesso de "produtos genéricos sem alma" no mercado até a cultura de influenciadores digitais. Mas o que realmente brilha são os diálogos afiados entre os protagonistas. A dinâmica entre o sensato Gaguinho e o caótico Patolino continua funcionando perfeitamente, e a dublagem brasileira — com as vozes já consagradas — faz essa química saltar da tela.

Este filme é um verdadeiro estouro!

A trilha sonora, como sempre, é outro destaque. Ela acompanha as cenas com precisão cirúrgica, fazendo os momentos de tensão parecerem mais absurdos e os momentos de comédia, ainda mais hilários. O ritmo do filme é bem acertado: com pouco mais de uma hora e vinte minutos, ele entrega o que promete sem se alongar demais, deixando aquele gostinho de "quero mais" no final.

Para quem cresceu vendo Looney Tunes ou simplesmente quer uma comédia leve e criativa, este é um prato cheio. É o tipo de filme ideal para se ver no cinema com pipoquinha ou em casa tomando um Nescauzinho. Ele não tenta reinventar a roda, mas reafirma o que torna os Looney Tunes tão especiais: o humor sem amarras, o absurdo bem dosado e personagens que já fazem parte da história da animação mundial.

looneytunesodiaqueaterraexplodiu02 53e85Fonte: Divulgação/Warner Bros.

Looney Tunes - O Dia Que A Terra Explodiu é, acima de tudo, uma carta de amor aos fãs. Talvez não seja o mais memorável de todos os tempos, mas é, sem dúvidas, um dos mais afetuosos. E nos dias de hoje, isso já vale muito. Quem sabe, seja também um novo pontapé para a Warner Bros. bolar mais ideias de filmes isolados com outros personagens ou até cruzando com essa histórias. Vamos ver o que vem por aí, não dá para saber ainda!

E por hoje é... só só só... pe-pe-pessoal!

Crítica do filme A Mais Preciosa das Cargas | Um pouco de humanidade no fim do mundo

Dirigido por Michel Hazanavicius e baseado na novela de Jean-Claude Grumberg, o filme “A Mais Preciosa das Cargas” mergulha na Segunda Guerra Mundial com uma estética singular para narrar a improvável história de um casal pobre que encontra uma criança atirada de um trem em movimento. A partir daí começa uma jornada silenciosa sobre sobrevivência, transformação e resistência.

Apesar da curta duração — apenas 81 minutos —, o filme tenta abarcar uma densidade emocional e simbólica considerável. É uma obra que fala sobre o horror, mas também sobre a beleza frágil que resiste mesmo em meio ao caos. Ainda que em certos momentos falte equilíbrio entre forma e conteúdo, “A Mais Preciosa das Cargas” encontra seus momentos de força quando aposta na sutileza em vez da exposição direta, especialmente ao retratar o cotidiano do casal e a crescente ligação com a criança. O filme, assim, caminha entre o bucólico e o brutal, entre o conto e a tragédia histórica.

Em tempos de guerra, quando a compaixão parece extinta e a violência se normaliza, “A Mais Preciosa das Cargas” propõe um olhar sensível sobre o resgate da humanidade por meio de um gesto de amor improvável. Um filme com ritmo lento, mas que conquista pela temática profunda e sempre necessária.

Entre o frio e a esperança

A narrativa se desenvolve a partir de duas histórias que correm em paralelo: a do lenhador e sua esposa, e a de uma família judia separada por um dos trens da morte. Essas tramas se entrelaçam de maneira poética, embora nem sempre com o impacto dramático esperado.

O vínculo que nasce entre a mulher e o bebê encontrado — e, posteriormente, o envolvimento do marido inicialmente relutante — compõem o centro emocional da obra. A transformação do pai, em especial, representa uma das mensagens mais fortes do filme: a possibilidade de amor mesmo em corações aparentemente endurecidos pela fome, pelo medo e pelo ódio.

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Visualmente, a obra adota uma animação desenhada à mão que foge dos padrões modernos e aposta em um estilo mais clássico, quase artesanal. Esse visual evoca tanto delicadeza quanto dureza, acompanhando bem o tom ambíguo do roteiro. No entanto, há momentos em que a paleta escura e os traços densos tornam difícil compreender o que está acontecendo em tela — uma escolha estética que, embora coerente com o clima sombrio, compromete um pouco a clareza narrativa.

A trilha sonora de Alexandre Desplat funciona como um dos pontos altos da obra. Em vez de ser apenas um pano de fundo, ela atua como guia emocional do espectador, preenchendo os silêncios e potencializando os momentos mais íntimos e dolorosos. Ainda assim, há quem possa sentir que, em certos momentos, a música dramatiza em excesso, impondo um sentimento em vez de permitir que ele emerja organicamente da cena.

Fábula sombria e intensa, mas pouco surpreendente

A maior fragilidade do filme está talvez em sua previsibilidade. O trailer entrega grande parte da trama, o que reduz o potencial de surpresa para quem já chega ao filme sabendo o que esperar. O espectador acaba apenas preenchendo lacunas daquilo que já foi antecipado, acompanhando as nuances do relacionamento entre os personagens e os contextos de guerra que os cercam. Isso não chega a esvaziar o impacto emocional da história, mas certamente limita seu alcance dramático.

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Ainda assim, “A Mais Preciosa das Cargas” cumpre um papel importante ao lembrar que, mesmo nas situações mais desesperadoras, o afeto e a solidariedade podem resistir. A fábula criada por Hazanavicius pode não atingir todo o seu potencial artístico ou emocional, mas tem valor ao propor uma reflexão delicada sobre o amor como forma de resistência. É um filme que talvez não surpreenda, mas que emociona nos detalhes — e, no fim, talvez seja justamente essa a sua maior carga preciosa.

Crítica Às Vezes Quero Sumir | Do Nada ao Lugar Nenhum

Primeiro, vamos esclarecer que esta, assim como toda crítica que trago aqui no site, é uma resenha a partir do meu ponto de vista, trazendo a minha impressão sobre a obra. Logo, se você assistir a “Às Vezes Quero Sumir” e ver genialidade no filme, está tudo bem, pois cada um vai ter sua respectiva opinião. Dito isso, vamos ao que interessa.

Obras de ficção têm papéis poderosos e, eu diria que até, fundamentais na sociedade. No entanto, algumas não parecem ter nada para contar. “Às Vezes Quero Sumir” se encaixa nesse segundo grupo, uma vez que não consegue cativar o espectador e, na verdade, consegue mais entediar do que servir como uma distração ou um material para reflexão.

Para você que não leu a sinopse, segue o texto original: A tímida Fran (Daisy Ridley) vê sua vida transformada com a chegada de um novo colega de trabalho. Uma conexão inesperada surge entre eles, ela terá que se reinventar para, enfim, embarcar na aventura de viver.

asvezesquerosumir01 185c9Fonte: Divulgação/Synapse Distribution - Às Vezes Quero Sumir mostra como um escritório é entediante

A temática é superimportante e a abordagem é válida, uma vez que reflete milhares de histórias comuns e facilita a conexão com o público. Contudo, de nada adianta um bom ponto de partida, um elenco competente e uma produção razoável, pois, como sempre, tudo depende de como uma história é contada e desenvolvida. Se o roteiro não vai progredir, não vai ter uma moral e será apenas um recorte de tristeza, acaba sendo bem superficial. Eis o tombo do filme.

Às Vezes Quero Sumir vale a pena?

Não vale a pena! “Às vezes Quero Sumir” é lento, permeado por diálogos cansativos, transições desconexas e uma trama que não vai a lugar algum. Como comédia, um filme que extrai poucas risadas. Como romance, uma obra que não permite o desenrolar da paixão. Como drama, um título sem superação. Talvez essa fosse a proposta, mostrar o beco sem saída da depressão. Todavia, não é para qualquer um e nem para qualquer momento.

Um assunto complexo

“Às vezes Quero Sumir” é o típico filme que tenta mostrar uma realidade a qual não estamos habituados, o que ele faz com maestria ao deixar o público desconfortável para revelar o dia a dia da personagem Fran, permeado por períodos cansativos de escritório, rotinas entediantes em casa e viagens em pensamentos aleatórios (como descansar na floresta ou fazer uma cabana de madeira na beira da praia). Assim, o longa-metragem parece tentar constantemente mostrar esse lado complexo da depressão e como ela afeta cada aspecto da vida da pessoa.

asvezesquerosumir02 85a4fFonte: Divulgação/Synapse Distribution - Fran (Daisy Ridley) em um mundo de delírios

Nesse sentido, é compreensível usar uma mixagem de som distorcida, em que ouvimos tudo à distância, não conseguimos prestar atenção nos diálogos e ficamos perdidos em meio às aleatoriedades. A obra se alonga muito para apresentar personagens, tudo acontece de forma lenta e com diálogos maçantes.

Tudo bem, a vida tem pessoas mais pacatas e outras mais agitadas, por isso o filme tenta contornar a situação ao equilibrar o ritmo com a chegada de Robert (Dave Merheje), que é animado e traz o tom de humor. De certa forma, o script consegue propor uma boa relação entre eles, mas as coisas são constantemente dificultadas pela depressão.

asvezesquerosumir03 bb5c2Fonte: Divulgação/Synapse Distribution - Dave Merheje contracena com Daisy Ridley numa tentativa de comédia romântica

O problema é que para provar um ponto, diretora e roteiristas fogem tanto do comum, que acaba sendo complicado se manter entretido pela história, que, evidentemente, pode fugir do comum, mas precisa dialogar com o público para entregar entretenimento ou, mesmo que seja, uma reflexão aprofundada.

Às Vezes Queria Não Assistir

A montanha-russa de pequenas alegrias e grandes tristezas de “Às Vezes Quero Sumir” acaba sendo complexa para a plateia que poderá cair no sono (com grandes períodos de silêncio) ou ficar entediada pela história rasa. A sensação que temos é de entrar conhecendo pouco dos personagens e sair como entramos.

Curiosamente, há um paralelo disso na trama, o que parece reforçar essa dificuldade das relações em meio à depressão. Só que a obra fica apenas patinando no cotidiano contemplativo da protagonista, que, apesar de fazer um esforço para lidar com situações rotineiras, não sabe lidar com as emoções.

asvezesquerosumir04 f501bFonte: Divulgação/Synapse Distribution - Às Vezes Quero Sumir é lento e dá sono, conforme comprova o ator do filme

No fim do dia, o filme não propõe nada lidar com os problemas e deixa apenas a personagem refletir levemente sobre suas ações. No fundo, uma obra que parece a vida real: estamos perdidos, temos problemas e não tem solução fácil. Lide com isso.

Quem lida bem com isso é o elenco, que acaba parecendo muito natural. Os elogios para Daisy Ridley (lembrada apenas por Star Wars) são válidos, pois a atriz se encaixou muito bem no papel. O problema para sua carreira é que este não é um papel para ser memorável, já que é uma obra que não cairá no gosto popular.

Dave Merheje se destaca muito em meio ao mar de tristeza, o que é perfeitamente natural, já que seu personagem é o engraçadão – o que deve ter exigido quase nada de um cara que já é comediante. Muito bom ver também Brittany O'Grady por aqui, mas apesar de sua fama em outros projetos, a atriz é bem secundária nessa trama.

asvezesquerosumir05 1cb6dFonte: Divulgação/Synapse Distribution - Daisy Ridley reflete sobre a existênia em Às Vezes Quero Sumir

Enfim, me parece um filme que, além de entediante, acaba sendo um desfavor. Não sei dizer se é uma obra adequada para quem está passando por situações depressivas, mas certamente é um filme que deprime aqueles que estão numa fase regular. Se esse era o objetivo, parabéns aos idealizadores, mas não acho que seja uma boa forma de conquistar o público.

Crítica do filme Olhos Famintos: Renascimento | Um Verdadeiro Lixo!

Lançado em 2001, o filme “Olhos Famintos” chegou sem grandes alardes e ninguém imaginava que a ideia original do roteiro poderia levar à criação de uma franquia. Embalado por perseguições em rodovias e com a introdução de um novo vilão (chamado de Creeper), o filme conquistou o público de certa forma.

Todo o mistério por trás do Creeper — que faz uma caçada a cada 23 anos e depois hiberna, bem como seu modus operandi — despertou a atenção de muita gente, afinal é raro ter um filme que traga novidades, ainda mais um novo monstro para mexer com o imaginário dos aficionados por terror.

Tanto é verdade que, em 2003, tivemos “Olhos Famintos 2”, um projeto que dividiu opiniões. Esta era uma continuação direta, ambientada na mesma época e que tentava manter o nível de produção e uma história ao menos coerente. Talvez por já não ser mais uma ideia original, este pareceu menos interessante e intenso, mas não foi de todo ruim.

Pulando 14 anos para o futuro, em 2017, Victor Salva (o mesmo diretor e roteirista dos dois primeiros filmes) tentou reavivar a franquia com o lançamento de “Olhos Famintos 3”, mas o resultado foi desastroso e, com o perdão do trocadilho, ficou claro que nem Salva poderia salvar a franquia. Este deveria ser o fim do Creeper e de Olhos Famintos.

olhosfamintosrenascimento04 16ad1Creeper em fim de carreira! - Fonte: Divulgação/Jeepers Creepers Reborn - ORWO Studios

Contudo, em 2023, tivemos uma surpresa: um trailer de “Olhos Famintos 4”, também conhecido como “Olhos Famintos: Renascimento”, dando a ideia da ressurreição da criatura e da franquia. Já aviso que não se trata do ressurgimento da franquia, mas de seu enterro por definitivo!

Segundo o The Movie Database, este longa-metragem teve orçamento de 5 milhões de dólares e conseguiu faturar pouco mais de 6 milhões. Definitivamente, um fato a ser comemorado, já que “Olhos Famintos: Renascimento” não é ruim, pois pra ficar ruim, ele teria que melhorar muito! Felizmente, eu não contribui para esse montante e esperei para ver na Paramount+ e, sinceramente, de graça, ainda saiu caro.

Spoiler abaixo: leia para poupar seu tempo

Na história, acompanhamos Chase e sua namorada Laine, que estão indo para o evento Horror Hound Festival, que reúne fãs do terror fazendo cosplay. Lá, eles vão obviamente se deparar com o Creeper, que tá ceifando a vida de geral. Ora, que surpresa, hein?! Já deixando o spoiler logo de cara, porque eu realmente estou te fazendo um favor! O roteiro até tenta inventar, mas tudo é realmente desconexo e sem explicação.

olhosfamintosrenascimento01 cd588Fonte: Divulgação/Jeepers Creepers Reborn - ORWO Studios

Olhos Famintos: Renascimento vale a pena?

Não! Se você dá valor para o seu tempo e o seu dinheiro, eu recomendo que você jamais veja “Olhos Famintos: Renascimento”. Trata-se de um filme com direção amadora, roteiro muito raso, atuações terríveis, efeitos especiais de baixa qualidade, trilha sonora repetitiva e a ruína de um vilão conceituado.

olhosfamintosrenascimento03 77258Fonte: Divulgação/Jeepers Creepers Reborn - ORWO Studio

Você ainda está lendo?

Eu poderia fazer uma análise detalhada de Olhos Famintos 4, mas acho que já ficou claro o quanto o filme é ruim. Certamente, é um projeto que não deveria ter existido, um enorme vacilo de quem tem os direitos autorais permitir fazer isso com a franquia. Não é preciso muito pra saber que o filme deu ruim, olha esta incrível foto do elenco:

olhosfamintosrenascimento02 e4f66Fonte: Divulgação/Jeepers Creepers Reborn - ORWO Studios

E é isso, não vou te enrolar mais, vá ver outros filmes de terror, deixo aqui algumas sugestões:

  • Vôo Noturno (filme com criatura misteriosa, baseado na obra do Stephen King)
  • O Nevoeiro (criaturas bizarras aparecem em meio à neblina misteriosa, também baseado na obra de Stephen King)
  • Ninguém vai te Salvar (filme que mistura ficção e terror, praticamente sem falas, mas muito intenso)
  • Piscina Infinita (filme doideira, até complicado explicar, veja o trailer)
  • O Mal que Nos Habita (um homem possuído, acontecimentos estranhos, sinistro)

Crítica Sobreviventes – Depois do Terremoto | Humanidade perdida nos escombros

O que você faria em meio a um desastre? Entraria em desespero? Buscaria uma saída lógica em meio ao caos? Ajudaria outras pessoas em situação de vulnerabilidade? Ou quem sabe observaria tudo de forma passiva sem muitas esperanças? Estas podem parecer questões filosóficas, mas frequentemente são pautas para diversas obras audiovisuais.

E não por acaso esses também são alguns dos dilemas abordados em “Sobreviventes – Depois do Terremoto”, filme que nos coloca junto aos moradores remanescentes do Hwang Gung Apartments, o único prédio que ficou em pé após um terremoto de proporções devastadoras na gigantesca Seul. Por ser a única esperança da população local, este espaço privado de alguns poucos apartamentos se torna refúgio e também a única esperança para muita gente.

sobreviventesdepoisdoterremoto 76ba0Fonte: Divulgação/Paris Filmes

Alguns residentes optam por ajudar os necessitados, mas outros acham a situação perigosa e complexa. Assim, pensando na inevitável escassez de insumos básicos para a sobrevivência, os moradores do prédio decidem expulsar os estrangeiros que ali se abrigaram temporariamente. Começa então uma corrida pela sobrevivência e uma guerra não apenas por espaço, mas também por todo tipo de suprimento e, principalmente, por superioridade.

Sobreviventes – Depois do Terremoto vale a pena?

Com atuações potentes que exaltam o drama da situação e colocam as emoções mais primitivas em primeiro plano, “Sobreviventes – Depois do Terremoto” é um filme que entrega boa dose de reflexão, mas sem deixar de equilibrar o ritmo com cenas engraçadas e um tanto inusitadas para um cenário de fim de mundo. Uma boa pedida para quem gosta de filmes que fogem do comum!

Filme de Desastre, mas focado no drama

Existe toda uma categoria de filmes hollywoodianos dedicados a abordagem de desastres, sejam eles furacões, vulcões, terremotos ou tsunamis. A abordagem vai desde a mais pura galhofa em “Terremoto: A Falha de San Andreas” com Dwayne Johson (vulgo The Rock) até os dramas mais intensos como “O Impossível” com Naomi Watts.

E a verdade é que não existe uma forma correta ou fórmula perfeita, já que alguns desses filmes são fictícios, enquanto outros são baseados em eventos históricos. No caso de “Sobreviventes – Depois do Terremoto”, o título já é bem explicativo: não se trata de um filme sobre o desastre, mas sim com uma abordagem dos eventos posteriores ao desastre, focando muito no drama.

sobreviventesdepoisdoterremoto02 9fd76Fonte: Divulgação/Paris Filmes

Então, se você espera ver cenas do terremoto engolindo toda a cidade, com sequências de destruições apocalípticas, intercaladas por desespero incessante, saiba que o filme coreano não deve atender todas suas expectativas. No entanto, fique tranquilo, as cenas de eclosão estão aqui, tanto para chocar já no começo da história, quanto posteriormente em alguns flashbacks.

E, por sinal, as sequências catastróficas são de altíssima qualidade, com excelentes efeitos especiais, que chocam pela magnitude dos eventos e a riqueza de detalhes com prédios desabando, carros sendo engolidos e outras situações mirabolantes. E fica o alerta para os mais sensíveis: o filme é bastante gráfico, com cenas de violência exageradas e muito sangue.

Utopia de Concreto

Aliás, retornando no tópico da narrativa, muito boa a construção do filme, que mescla cenas presentes, com os momentos derradeiros dos personagens quando estavam presenciando o começo da desgraça. Através desses arcos, o longa-metragem cruza o caminho dos personagens, de modo que logo fica fácil perceber o rumo dessa história.

Todavia, não se engane, mesmo com alguns clichês, o roteiro de Lee Shin-ji e Tae-hwa Eom — este também diretor da obra — surpreende em vários momentos cruciais, inclusive na conclusão. É óbvio que o ponto principal do filme é tratar de situações extremas, não apenas do terremoto, mas principalmente das personalidades fortes e da falta de sensibilidade do ser humano e, nisso, o filme tem muito êxito!

sobreviventesdepoisdoterremoto03 1895fFonte: Divulgação/Paris Filmes

No fim das contas, parafraseando o título americanizado da obra, temos aqui uma verdadeira Utopia de Concreto, em que os humanos pensam que podem se prender a bens materiais e através disso podem ter superioridade aos demais. Contudo, assim como os prédios, a humanidade pode ruir aos poucos quando os alicerces não são sólidos!

Enfim, se você quer fugir do lugar comum, vale a pena dar uma chance para mais uma obra coreana, que, como de costume, aproveita muito as atuações poderosas para nos mostrar mais do que apenas efeitos especiais. E, não se engane, porque se você gosta de ação e aventura, “Sobreviventes – Depois do Terremoto” é um acerto em cheio, ainda mais se visto na telona!

Crítica do filme A Sindicalista | Enfrentando o machismo estrutural

O mundo está repleto de histórias que não conhecemos e a obra “A Sindicalista” conta mais uma que muito possivelmente você não teve conhecimento. Trata-se de um episódio bem recente ocorrido na França, que teve seus primeiros desdobramentos lá em 2012, com uma repercussão grande em rede nacional, mas com desfecho parcial apenas em 2020.

Baseado em fatos, o filme estrelado por Isabelle Huppert relata um fragmento intenso da vida de Maureen Kearney (Huppert), que não apenas atuou como uma importante representante sindical na França, como foi responsável por denunciar acordos secretos que abalaram a indústria nuclear francesa.

Apesar do viés trabalhista no início, a trama de “A Sindicalista” se intensifica no conflito individual, na tentativa de desvendar os responsáveis por um ataque violento contra a vida de Kearney. Assim, acompanhamos a protagonista numa luta para tentar provar que este não foi um ataque ao acaso, mas uma armação de um complô nuclear com agentes poderosos.

asindicalista01 b6228Fonte: Divulgação/Synapse

Dessa forma, “A Sindicalista” é um drama intenso, porém permeado por muito suspense que deixa o espectador curioso para saber o resultado desse conflito desproporcional. Contudo, além do entretenimento, temos aqui material para refletir sobre a revitimização: situações em que, mesmo diante da violência sexual, a palavra de uma mulher está em xeque!

A Sindicalista vale a pena?

A Sindicalista” pode parecer uma ficção, mas nada mais é do que um retrato realista de uma sociedade machista e covarde, que repetidamente reduz o papel da mulher e escancara uma articulação inerente capaz de transformar a vítima em suspeita. Destaque mais do que especial para Isabelle Huppert que leva o filme nas costas! Um ótimo filme para debate, mas também pode servir como entretenimento para os menos calorosos.

Muito além da ficção

Após denunciar o ocorrido à polícia, uma investigação é instaurada para buscar provas que levem até os criminosos ou ao menos a uma resolução, já que o caso ganhou projeção. Por uma suposta falta de provas (que não vou detalhar para evitar spoilers) os detetives sugerem que as opções foram esgotadas e, assim, colocam o depoimento de Kearney em questão.

Numa tática recorrente do machismo estrutural, eles tentam culpabilizar a vítima, sugerindo que o caso foi inventado ou que a vítima é de fato culpada por tais atos. Dessa forma, os agentes apelam para repetições do depoimento, violência verbal e até para argumentações quanto à vestimenta da protagonista, de modo que a vítima confesse ter inventado tudo.

Já pensou que terrível passar por uma situação de violência e duvidarem de sua palavra? Isto é bem comum no Brasil e no mundo, então não é só um filme. Acontece que essa culpabilização, a reconstrução da cena na cabeça, os depoimentos repetitivos e outros fatores levam a vítima a sofrer ainda mais ao revisitar tudo gerando um trauma ainda maior.

asindicalista02 b87edFonte: Divulgação/Synapse

No Brasil, desde novembro de 2021, em teoria, as mulheres estão amparadas pela Lei 14.245, ou Lei Mariana Ferrer, que visa evitar a revitimização de mulheres no atendimento por agentes públicos. Traduzindo: mulheres em situações vulneráveis de violência não podem ter sua palavra questionada, evitando procedimentos desnecessários que podem causar mais traumas.

A história de Kearney, contudo, não se passa no Brasil e já tem mais de década, logo era outra realidade. De qualquer forma, o ponto é perceber que a trama é apenas um caso que ganhou notoriedade, porém há uma infinidade de mulheres que passam por isso: sofrem a violência, precisam vencer o medo para denunciar e ainda podem se tornar suspeitas.

Filme realista com atuação poderosa

Bom, já falamos da história e do debate central do filme, resta então comentar sobre a execução. Não é de hoje que o cinema francês difere muito do hollywoodiano. No geral, a abordagem francesa é muito mais séria e menos sensacionalista. Assim, é comum ver filmes da França e estranhar a falta de dinamismo, o que é notável também neste caso.

O diretor Jean-Paul Salomé tem uma carreira de longa data, mas com obras intercaladas por longos hiatos. Nota-se que ele é bastante conservador no estilo, com enquadramentos que pouco inventivos, sendo que há uma clara diferença entre a edição ousada do trailer e o resultado do filme.

É claro que em determinadas situações, a direção está intimamente ligada ao roteiro, então a história também não permite muita inventividade. Soma-se a isso o fato de que o script é um bocado alongado, o que acaba prejudicando o ritmo em alguns trechos. São muitos personagens, diálogos longos e uma construção de trama que demanda certo tempo.

asindicalista03 a57aaFonte: Divulgação/Synapse

Felizmente, há Isabelle Huppert como contraponto, sendo que a atriz domina todas as cenas com olhares marcantes e uma presença imponente. Olhando a intensidade e as cenas repletas de close, fica evidente que somente uma atriz com tamanha expertise poderia encarar esse papel. Sim, o elenco como um todo é bom, mas o foco está realmente na protagonista.

Por se tratar de um roteiro muito centrado na protagonista, é impossível ter um filme impactante sem uma pessoa sútil e ousada em medidas similares. Os desafios eram muitos, mas Ruppert entrega uma atuação irreparável, com diálogos convincentes, interlocuções enérgicas e muito jogo de cintura para equilibrar a personagem entre o drama e a coragem.

Destaques também para a maquiagem, que deixou a atriz muito parecida com Maureen Kearney; o que não faz diferença para quem não conhece a pessoa, mas é ótimo ver uma história real o mais fiel possível. Por fim, menção especial para a trilha sonora, que propicia bons momentos de tensão. No todo, “A Sindicalista” é um filme sólido e altamente recomendado!