Crítica do filme O Menino Que Descobriu o Vento
Sob nova direção
Longe de ser um filme trágico sobre a África, o “O Menino que descobriu o Vento” de Chiwetel Ejiofor, baseado na história real de William Kamkwamba e do livro homônimo de Bryan Mealer, engrandece e inspira o telespectador a acreditar na resiliência, o poder de se adaptar às mudanças e dificuldades que surgem no caminho, e na educação, como agente de transformação social.
Filho de pequenos agricultores em Malawi, país africano com um dos índices de desenvolvimento humano mais baixo do continente, William Kamkwamba (Maxwell Simba) tem a chance de estudar em uma escola particular no vilarejo. Mas, por pouco tempo, sem condições de arcar com os custos financeiros da escola, retorna para lavoura com o seu pai.
Neste mesmo tempo, diante da tensão política internacional e nacional, o governo resolve investir na indústria de tabaco para mover a economia. Para isso, comprou inúmeras árvores presentes no vilarejo de agricultores, em especial, nas terras que a família Kamkwamba trabalhava.
Com o desmatamento de árvores, os produtores da região enfrentam um período de forte inundações e seca. Em consequência: a falta de alimento. Contra todas as probabilidades para ajudar o vilarejo, William encontrou a solução em um lugar só: na ciência.
A drama dirigido e estrelado por Chiwetel Ejiofor, conhecido por sua atuação premiada como Solomon Northup em “12 anos de Escuridão”, rompe a maneira estereotipada de retratar a pobreza e fome na África, sem deixar de atribuir o tom crítico sobre o contexto político no país.
O longa tem como roteirista Ejiofor, filho de pais nigerianos e antepassados igbos, Mealer e, o próprio William Kamkwamba, que tentam trazer a todo momento à realidade do vilarejo, seja na língua local malawiana, que está presente em boa parte dos diálogos do filme, quanto o aspecto cultural, como a religião e a alimentação.
“Democracia é igual mandioca estrangeira, apodrece rápido”
Com uma narrativa clássica e um final previsível, o filme se abstém de tensões desnecessárias para criar um clima de aflição, e reforça o aspecto dramático em diálogos emotivos sobre família e sentimento de incapacidade. Sem perder o tom crítico sobre a política nacional e internacional, Eijor traz falas ácidas, como o do seu personagem Trywell Kamkwamba, ao ver o carro de som do governo. “Democracia é igual mandioca estrangeira, apodrece rápido”.
De forma sutil e sem tornar algo incômodo, Ejiofor se utiliza de alegorias e elementos para retratar a consequência trágica da falta de alimento: a morte. Além de atuações impecáveis deChiwetel Ejiofor, Maxwell Simba, o ator revelação, e Aïssa Maïga (Bem vindo à Marly-Gomont).
Diferente de boa parte dos filmes produzidos, que caracterizam personagens femininas como sensíveis, frágeis e com poucas falas, como aponta o estudo “Inequality in 700 Popular Films” realizado pela Universidade do Sul da Califórnia, o longa enaltecem a força, a coragem e o olhar crítico de Agnes Kamkwamba (Aïssa Maïga), mãe de Kamkwamba, que até chega relembrar a mãe de Wangari Maatha, que após desconstruir barreiras colocou a sua filha na escola, e hoje ela é fundadora do movimento Green Belt na África e ganhadora do prêmio Nobel da Paz.
Apesar do filme retratar a genialidade e a invenção de William como a solução para a crise hídrica e da fome na aldeia, a persongem Agnes não tem espaço para ser frágil, ela é a peça chave, que chega até ser a heroína, para que o projeto do seu filho ganhasse vida.
Um filme inspirador que representa diferentes minorias, entre elas o povo africano e a força da mulher negra perante à fragilidade da vida, e o cuidado com o planeta Terra. Muito mais que contar uma história, o "O menino que Descobriu o Vento" é um alerta sobre os métodos de agricultura e a importância de políticas públicas de proteção ambiental. Não existe vida sem natureza.
Eu não podia aceitar aquele destino como futuro...