Crítica do filme T2 Trainspotting

Você é um viciado em nostalgia

por
Thiago Moura

23 de Março de 2017
Fonte da imagem: Divulgação/Sony Pictures
Tema 🌞 🌚
Tempo 🕐 5 min

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Não tente retornar ao seu passado. Tudo era maior, mais colorido e intenso do que parece hoje em dia, como adulto. Mantenha sua memória vívida, mas não tente reviver aquele momento, pois vai parecer muito chato. Embora o diretor Danny Boyle tenha afirmado em entrevistas que não pretendia recriar algo tão icônico quanto o original, "T2 Trainspotting" bebe e revive o passado constantemente.

Considere os tumultuados anos 90, onde o grunge deu seu lugar a raves e música eletrônica, ao lado de diversas drogas sintéticas e toda a estética estranha que tanto amamos. Lembra de Born Slippy? É claro que sim! Mas estamos em 2017, muita coisa mudou e é nesse cenário que "T2" encontra-se.

O marcante discurso de "Choose Life" é um grande desafio que é aceito por Boyle, que sabe exatamente como retratar isso com diálogos inteligentes, imagens divertidas e cenas marcantes. Só que tudo isso já estava no primeiro filme, então sua relação com "T2" vai depender da sua identificação com o "Trainspotting" original.

Mesmas pessoas, erros diferentes

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Um dos motivos do hype por "T2" é o retorno de todo o elenco original. Ewan McGregor (Mark Renton), Jonny Lee Miller (Sick Boy/Simon), Robert Carlyle (Begbie), Ewen Bremner (Spud) e até uma breve participação de Kelly Macdonald (Diane, a colegial). É justo dizer que após 20 anos eles até que envelheceram bem, principalmente se levarmos em conta a quantidade de drogas utilizadas.

Brincadeiras a parte, a química entre os atores é tão tangível que realmente parece um reencontro de velhos amigos, exceto que o final do primeiro filme não foi exatamente amistoso. As 16 mil libras que deveriam ser repartidas igualmente entre eles foram levadas por Mark, e obviamente seus companheiros não ficaram felizes com isso.

Renton retorna para Edimburgo, encontrando Simon tentando manter um bar que não é exatamente popular na cidade, viciado em cocaína e que busca chantagear figurões da cidade com sua parceira Veronika (Anjela Nedyalkova). Begbie está preso e alimenta um ódio mortal por Renton, enquanto Spud voltou a usar heroína após uma série de desastres em sua vida pessoal. Basicamente estão todos tão perdidos na vida quanto a 20 anos atrás.

“Trainspotting” foi baseado no livro de Irvine Welsh, tendo uma sequência intitulada “Porno”, onde o foco é o vício em pornografia. Algumas ideias foram emprestadas desse material, mas no geral é uma história nova que se conecta diretamente ao primeiro filme.

Mas e as drogas?

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Bem, eles continuam usando drogas sim. Mas de forma bem menos regular e decadente, ao invés de simplesmente sair por aí ficando doidões, o foco agora é outro. E infelizmente cenas icônicas como Mark tentando resgatar um supositório no pior banheiro da Escócia ou bebês bizarros andando no teto não cabem em "T2".

Em diversas cenas, os protagonistas estão cercados de memórias e nostalgia; Simon tem diversas fotografias antigas a sua volta, Spud começa a escrever todos as aventuras quase inacreditáveis da juventude ao lado de seus amigos e Mark revisita locais e até reencena momentos do primeiro filme, enquanto Begby não conseguiu se conformar com a traição.
Todos estão presos ao passado e não conseguem amadurecer para ter uma vida melhor, em grande parte pelas memórias que os prendem.

Sendo assim, para quem não conhece o primeiro “Trainspotting”, pode parecer uma história fresca e intrigante, mas os fãs recebem essa sequência como um complemento bem-vindo as questões que ficaram no passado, além de rever os personagens queridos. Contudo, a nostalgia é o combustível.

Não tente fugir do vício, seja viciado em outra coisa

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Mesmo sem as drogas e todo o discurso velado dos anos 90, "T2" é de certa forma deprimente, mostrando que se você não fizer nada pra mudar, daqui a 20 anos vai ser tudo igual na sua vida. O primeiro filme engana ao mostrar a traição de Renton, roubando dinheiro dos amigos e fugindo em busca de uma oportunidade nova, dando esperança de que tudo pode melhorar. Mas a verdade é que a história se repete, uma nova oportunidade de traição aparece e tudo volta ao começo, as vezes pior.

Nostalgia pode prover um certo conforto, mas como Sick Boy diz para Renton, “Você é um turista em sua própria memória. Só está aqui pela nostalgia.” Isso serve muito bem para você, assistindo o mesmo filme que te marcou a vários anos atrás. O ponto é que o filme mostra que o conforto pode ser bastante prejudicial. Quem nunca parou para pensar em algum ponto da sua vida “estou fazendo algo significativo?”

Enfim, o discurso que encerra o primeiro filme da forma mais catártica possível está presente aqui, mas repaginado para nossa época. Renton proclama essas palavras durante o trailer, mas no filme é totalmente deslocado e não condiz minimamente com a filosofia de “escolha a vida”. De qualquer forma, são ótimas ideias e um ótimo filme.

Fonte das imagens: Divulgação/Sony Pictures

T2 Trainspotting

20 anos se passaram, muita coisa mudou

Diretor: Danny Boyle
Duração: 117 min
Estreia: 23 / Mar / 2017
Thiago Moura

Curto as parada massa.