Crítica do filme Vidas Partidas | Arte que (infelizmente) imita a vida

Graça (Naura Schneider) e Raul (Domingos Montagner) são um casal comum. Casaram-se, construíram seu lar, tiveram duas filhas e vivem uma vida razoavelmente confortável em um bairro da bela cidade de Recife, no Pernambuco. Algo incomum para a época, Graça é a principal fonte de renda da família, já que Raul tirou um tempo para estudar e só agora volta ao mercado de trabalho.

Num Brasil da década de 80, os dois são felizes, se amam, possuem uma vida ativa – tanto social quando sexualmente. Tudo começa a mudar, no entanto, quando Raul recupera seu posto de provedor principal da casa. Cada vez mais orgulhoso e possessivo, o professor passa a se comportar com agressividade, de forma abusiva e com desdém com relação às conquistas da esposa. 

 O longa “Vidas Partidas”, dirigido pelo global Marcos Schechtman (que, caso seja noveleiro, você já conhece de produções como Caminhos das Índias e O Clone, entre outras) e roteirizado por José Carvalho poderia contar a história de qualquer uma das 147.691 mulheres brasileiras que sofreram violência doméstica no ano passado. No entanto, o filme é inspirado na história de uma delas, um caso que ganhou projeção e inspirou a mais importante lei contra a violência doméstica, o caso de Maria da Penha Maia Fernandes.

Precisamos falar sobre as Graças e os Rauls

Do momento em que você começou a ler este texto até agora, mais uma mulher foi parar no hospital, vítima de violência doméstica. Isso mesmo, de acordo com dados divulgados pela “Mapa da Violência – Homicídio de Mulheres” a cada 4 minutos, uma mulher é atendida no SUS depois de sofrer este tipo de agressão. E mais, em 80% dos casos de violência contra a mulher, o agressor é o companheiro (marido, namorado, amante, ex-parceiro). 

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Ou seja, não é brincadeira, e acontece o tempo todo muito perto de cada um de nós. É por isso que o longa “Vidas Partidas” é tão relevante, porque trata de uma temática que precisa ser discutida. Conforme o filme vai se desenrolando, vemos um Raul ganhando confiança e perdendo cada vez mais o respeito pela mulher, uma bióloga que trabalha em um importante instituto e que passa a ser reconhecida pelo seu trabalho, onde chega a receber um prêmio. 

Graça passa por duas tentativas de feminicídio, que fazem com que ela sofra severas consequências. Ficção? Sim, livremente inspirada em uma triste realidade, uma vez que foi exatamente isso que aconteceu com Maria da Penha.

Suspense e narrativa instigante

Embora seja categorizado como um Drama, “Vidas Partidas” tem sua trama encaminhada de forma a instigar a curiosidade e envolver o telespectador. Quando o filme começa, já sabemos onde ele vai chegar. Mas, como ele vai nos levar até lá? 

É esta a grande surpresa e o grande trunfo deste longa metragem: sua estrutura narrativa. Para isso, Marcos Schechtman utiliza muito bem dois importantes recursos: a linha do tempo descontínua e o tom de suspense.

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O filme mostra acontecimentos de 1982, 1992 e 2006, que se intercalam não necessariamente em ordem cronológica, o que instiga o público e desperta a curiosidade para saber o que vai acontecer.

Neste sentido, o uso de técnicas muito características dos filmes de suspense também ajuda muito:  a trilha sonora, a iluminação e as tomadas com enquadramentos que fazem com que o telespectador se sinta parte do vídeo, sem saber exatamente o que vai acontecer. Os movimentos de câmera são outro grande destaque, pois ajudam a ambientar bem as cenas e contribuem com a sensação de suspense.

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Do ponto de vista técnico, talvez o aspecto em que filme mais peca seja na parte da ambientação e figurino. Embora seja ambientado no início dos anos 80, em diversas cenas fica difícil esconder alguns elementos mais modernos do que isso, apesar do claro esforço da produção em situar a trama adequadamente. Se o longa-metragem não dissesse claramente em que anos se passa sua história, não seria tão difícil enganar o público e dizer que ela é dos anos 90.

No entanto, isso não prejudica o andamento de “Vidas Partidas”, que sob todos os outros pontos de vista conta muito bem a história que se propõe a contar, surpreende em vários momentos, além de trazer uma temática de extrema relevância.

No Brasil, uma a cada cinco mulheres já foi ou é vítima de violência doméstica.

O talento do elenco também conta muitos pontos na construção deste longa-metragem, que traz alguns rostos conhecidos, como os de Milhem Cortaz e Nelson Freitas, além dos atores que encarnam os protagonistas, Naura Schneider e Domingos Montagner. Ambos, especialmente, fazem um belíssimo trabalho, mostram uma grande sintonia e destreza mesmo nas cenas mais complexas, como as de sexo e as de violência.

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Naura, inclusive, está excepcional no papel de uma vítima de violência doméstica. O medo estampado no olhar de quem encontra o agressor, a mudança na alegria da personagem do começo da trama até a fase final, quando passa a ser agredida, tudo isso é muito vívido no trabalho da atriz.

Um belo trabalho coletivo da equipe de produção, atores e sintonia com a mensagem que se quer passar. Altamente recomendado!

Crítica do filme Negócio das Arábias | Tudo acontece, Babaganuche

O trailer de “Negócio das Arábias” – e também o título do filme – pode ter deixado você um tanto encucado com o rumo que essa história poderia tomar no cinema.

As poucas dicas do vídeo apenas nos informam que Alan Clay (Tom Hanks), um homem de negócios, foi para a Arábia Saudita na tentativa de arrumar sua vida financeira.

Acontece que, ao acompanhar a história mais de perto, percebemos que o roteiro vai muito além dessas questões. Na cidade de Jeddah, longe da realidade dos Estados Unidos, ele realiza várias tentativas para conseguir dinheiro, provar para sua filha que ele é um homem capaz e, talvez, realizar algo surpreendente em sua vida.

Só que o mundo neste mar de areia pode ser mais doido do que Clay imagina para uma viagem de negócios. Ele se depara com pessoas muito diferentes, bem como com ambições e peculiaridades que não imaginava. “Negócio das Arábias” é assim, um filme de pluralidade com roteiro inesperado e diversão pontual que mostra formas distintas de encarar a vida.

Bagunça com bom humor

O roteiro de “Negócio das Arábias” é bastante simples. A ideia vem do livro “Um Holograma para o Rei”, que trata justamente do tal negócio que o protagonista vai fazer com um dos líderes da região lá nas Arábias. A tradução do título para o português faz bastante sentido, uma vez que o nome do livro talvez ficasse um pouco confuso na divulgação do filme.

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Acontece que entre o argumento básico e a execução do longa-metragem há um mar de coisas. Alan Clay vai para o Oriente Médio com um objetivo bem simples. Todavia, conforme você pode ver no trailer, o rei não é uma pessoa muito acessível. A forma como isso é apresentado dá a entender que as coisas funcionam de uma maneira bem alternativa por lá.

Pessoas desinformadas, problemas de comunicação, limitações no ambiente de trabalho, areia, falta de recursos, lugares enormes, vestimentas, mais areia, calor absurdo, proibição de bebidas alcóolicas, costumes, locais públicos para execuções e areia que não acaba mais. Tudo isso contribui para deixar Clay um pouco irritado, cansado e desorientado neste mundão. As piadas, o ritmo do filme e a trilha, por outro lado, mostram que nem tudo é o fim do mundo.

Enfim, com as tantas dificuldades para encontrar o rei, o executivo de vendas resolve aproveitar o tempo vago para explorar o deserto. Ele conta com a ajuda de Yousef (Alexander Black) para fazer esse tour pelas arábias. O ator coadjuvante — ainda um novato em longa-metragens — interpreta um árabe bem engraçado e se mostra bem versátil para contracenar com Tom Hanks. As falas de um completam a do outro, o que garante dinamismo na trama.

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A presença de outros personagens como a doutora Zahra (Sarita Choudhury, que você talvez conheça de “Jogos Vorazes” ou da série “Homeland”) e da colega Hanne (Sidse Babett Knudsen) ajudam a diversificar a trama. O protagonista vai da areia à balada, da balada ao consultório médico, do consultório a um edifício em construção. É uma verdadeira salada-mista, mas as piadas pontuais acabam deixando o passeio pelas Arábias bem divertido.

Dê uma chance para o diferente

Tão importante quanto a trama principal é a construção de uma segunda temática dentro do filme. Apesar de mostrar um protagonista bastante exausto por conta dos problemas da vida pessoal, que não parecem ser facilmente resolvidos com a viagem para as Arábias, o longa faz questão de desenvolver algumas ideias em segundo plano que acabam sendo bem válidas e pouco comuns.

Tom Hanks mostra novamente seu talento, sendo o cara isolado no meio de um universo peculiar, que apresenta temas que podem deixar a plateia relutante

O roteiro aproveita vários cenários para desconstruir a visão que muitos têm do Oriente Médio. Com o foco nas grandezas da região, nos monumentos, nas peculiaridades do povo e em vários costumes que destoam do que acontece no Ocidente, o filme consegue passar uma visão muito otimista, sem deixar de pautar algumas regras e práticas um tanto questionáveis.

Alguns temas latentes centralizam nas limitações impostas às mulheres, que são submissas e sofrem muito diante de leis tão rígidas. São características incabíveis para muitos espectadores, ainda mais em sociedades como a nossa que tentam justamente obter a igualdade de direitos. A história ainda aborda outros problemas que são tapados com a peneira, como a questão da mão de obra filipina.

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A escolha de Tom Hanks para explorar esse mundo foi um passo na direção certa. O ator mostra novamente sua competência em levar um filme todo nas costas, sendo o cara isolado no meio de um universo bem peculiar. A bagunça para fazer o personagem passar por tantas situações bizarras talvez foi um pouco desnecessária, mas no fim, com o talento de Hanks, o título surpreende.

Apesar de deixar a plateia um tanto relutante sobre a cultura distinta, a obra de Tom Tykwer (“A Viagem” e “Sense 8”) é mais um convite do que uma crítica ao diferente. Com o exemplo de Alan Clay, o longa-metragem “Negócio das Arábias” mostra que é sempre importante correr atrás da felicidade, seja viajando, tentando novamente, aproveitando as pequenas coisas. Isso sim é o verdadeiro negócio, seja nas Arábias ou em qualquer lugar do mundo.

Sobre Café e Cigarros | Trailer oficial e sinopse

Não são poucas as pessoas que adoram combinar café e cigarro. Esses dois produtos viciantes são elementos básicos no filme "Sobre Café e Cigarros", que apresenta 11 pequenas histórias, nas quais personagens discutem os mais variados assuntos enquanto consome um cafeína e nicotina.

Entre os temas, os personagens do filme discutem sobre Abbott & Costello, o melhor jeito de se preparar um chá inglês, as invenções de Nikola Tesla, a cidade de Paris na década de 1920, rock e outros tantos assuntos interessantes. No elenco, nomes como Bill Murray, Tom Waits, Roberto Benigni, Steven Wright, Iggy Pop, Steve Buscemi, Cate Blanchett e Alfred Molina.

The Intervention | Trailer e sinopse

Um grupo de amigos de longa data se reencontra para um final de semana de nostalgia, mas o clima fica pesado quando um dos casais descobre que o real motivo para o encontro é uma intervenção sobre a relação amorosa dos dois.