Stan Lee - Café com Filme

State Like Sleep | Trailer oficial e sinopse

Um ano depois da morte de seu marido bélgico, a fotógrafa americana Katherine (Katherine Waterston) retorna para Bruxelas, a cidade onde eles dividiam um apartamento. Confrontando seu luto e a realidade do casamento complicado dos dois, Katherine descobre uma série de segredos que a fazem investigar as circustâncias dos últimas dias de vida do marido.

Crítica do filme A Casa que Jack construiu | A arte nos alicerces da loucura

Quem já viu ao menos um filme de Lars von Trier sabe que o cara não faz filme para as massas – e não estou falando num sentido pejorativo, mas é fato que seus roteiros são pouco digeríveis e muita gente só consegue sentir repulsa a suas analogias.

Suas abordagens de temas chocantes são pra lá de polêmicas e, ao menos a meu ver, ele tem fases um tanto distintas. Eu já vi o lado dele mais voltado à natureza humana, bem como já pude ver sua percepção de insignificância do ser perante o universo.

Agora, em sua mais recente adaptação, von Trier parece querer explorar o lado mais obscuro da mente humana, numa viagem pela lógica – se é que esse termo se aplica em alguma coisa do cineasta – de um serial killer.

Afinal, o que motiva alguém a matar outrem? O que leva alguém a matar repetidas vezes, de forma até compulsiva, tantas pessoas pelo simples prazer de ver a vida se esvair? Há tantos impulsos, variáveis, emoções e pensamentos que se disfarçam de motivações, mas será que há uma justificava final?

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Esta é uma das raízes para tantos filmes sobre assassinos em série: explicar o inexplicável. É claro que cada roteirista tem uma determinada inclinação para uma abordagem, que dificilmente vai conseguir chegar a algum lugar, mas alguma conclusão sempre pode ser tirada – até mesmo da mais confusa das obras.

Lars von Trier, como de praxe, resolve seguir uma vertente mais ousada, mostrando toda a violência possível de alguém que mata por prazer, mas sem deixar de mostrar que, apesar de quase inexplicável, pode haver um tom de coerência e até de arte por trás de tamanha brutalidade.

Em “A Casa que Jack construiu”, acompanhamos a jornada de Jack (Matt Dillon), que nos conta suas peripécias ao longo de doze anos, período em que refinou suas habilidades em uma série de assassinatos. Felizmente, desta vez, o cineasta conseguiu resumir a história em pouco menos de três horas, mas há boas motivações.

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Só para adiantar, é um filme brutal em sua essência, que visa retratar apenas o lado do assassino, então não espere nada menos do que uma pegada desumana e visceral. Na sala em que eu estava, um idoso saiu logo após uma hora de filme e chamou todos os espectadores de “perturbados”. Engraçado porque é verdade.

Bom, mas vamos ao que interessa. Abaixo, vou comentar um pouco sobre minha perspectiva desta obra de Lars von Trier. Por se tratar de um filme um bocado complexo, é inevitável fazer um texto mais elaborado sem entrar em detalhes. Então, esteja avisado: esta crítica contém spoilers.

Filme, documentário ou debate?

Via de regra, filmes como “Zodíaco”, “Seven” ou “O Silêncio dos Inocentes” seguem uma linha bastante clara dentro de um cenário fictício. Vez ou outra, alguns roteiros usam de recursos com diálogos em segundo plano para facilitar a linha de raciocínio, mas esta não é uma regra para os títulos de suspense pautados em serial killers.

Nesse sentido, até determinada parte, von Trier segue a cartilha, com uma história até linear e uma conversa de fundo, que pode ser entre o protagonista e um psicólogo, por exemplo. Todavia, o papo secundário aqui parece ser um recurso conveniente para dar mais sustento a uma outra linha de raciocínio, já que somente a história principal seria violência gratuita sem motivo – não que a adição de uma conversa mude isso.

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É claro que os desavisados já podem estranhar um bocado o filme após o primeiro capítulo, já que tão logo possível, o diretor nos presenteia com cenas ilustrativas para embasar as falas do personagem. Isso vai desde cenas de tigres na selva até um pianista tocando com maestria. Qual o sentido? Às vezes, nenhum. Mas é a arte...

E eis aqui o ponto que quero chegar, essa discussão de arte insistente no filme é algo que talvez faça algum sentido na cabeça do protagonista – e por que não de outros tantos psicopatas que fizeram atrocidades ao longo da história da humanidade? A destruição, a morte e a violência dificilmente são associadas à arte, mas eis o trunfo do filme, que tenta sugerir o bizarro e inconcebível para muitos espectadores.

O mais interessante é que não é de todo tosca a linha de lógica do assassino, uma vez que ele consegue formular boas justificativas para suas ações, mesmo que isso seja completamente contra a moral e a civilidade. Logo, somos presos em sua mente e queremos saber qual será seu próximo passo e onde ele quer chegar – e mais, o que tudo isso pode ter a ver com a casa dele.

Um ponto válido a ser apontado é que o diretor dinamarquês quebra a máxima de sua estranheza inerente ao balancear esse debate entre a ficção e a arte. Além disso, a meu ver, ele parece querer se justificar com esta obra, já que as questões apresentadas por Jack também são pertinentes para outros artistas.

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Enquanto tantas pessoas questionam os limites da arte e criticam fortemente os títulos de von Trier, ele mesmo resolve se justificar e propor que, às vezes, é preciso um bocado de estranheza, violência desmedida, assuntos inconvenientes e uma linguagem ousada para criar algo único e memorável.

No fim, esta parece ser a mensagem, a arte deve perpetuar, custe o que custar. Se isto é certo? Provavelmente não. Se alguém concorda? Também não. Mas oras, não assistimos aos filmes porque compactuamos com um ponto de vista, mas porque queremos fazer parte deste debate e opinar sobre a arte alheia.

Violência do jeito que a gente gosta

Bom, apesar de todo esse debate de arte, uma coisa que eu devo enaltecer aqui foi a capacidade de Lars von Trier de sair de sua zona de conforto (e desconforto para os demais) para entrar em uma linha mais direta e inteligível. É bom sim que “A Casa que Jack construiu” seja em seu cerne um filme de serial killer, pois podemos ver outras capacidades do diretor.

Ainda que dividido em alguns capítulos para criar esse debate, o roteiro é centrado nas histórias de Jack, de modo que podemos acompanhar com clareza de detalhes toda sua psicopatia e nos deleitar com um banho de sangue, pautado em uma brutalidade, às vezes, até descomunal. Não, as mortes apresentadas não ficam só no básico, afinal esta é a melhor assinatura do diretor. E daí a polêmica, claro.

Felizmente, temos um ator incrivelmente persuasivo no papel principal. Matt Dillon se consagra aqui, dando uma aula de encenação e loucura como vimos poucas vezes. Enquanto alguns psicopatas tendem a se esconder nos filmes, Jack domina toda a película, já que a perspectiva do roteiro é completamente avessa ao comum. E aí é que entra a necessidade de alguém muito talentoso e dedicado.

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Particularmente, eu vejo Dillon aqui num misto entre a loucura e o charme. A forma como Matt Dillon expressa cada frase e a força com que ele domina as cenas, bem como suas vítimas, é algo para aplaudir em pé.

Não sei porquê, mas ele me pareceu um ator que consegue balancear as caretas insanas de Jim Carrey e a postura pomposa de Josh Brolin. Faz sentido? Talvez não, mas só achei válido comentar que algumas cenas ele me lembra um ou outro, talvez eles tenham feito a mesma escola de artes cênicas.

Obviamente, para a mágica acontecer do jeito que a gente gosta, há toda uma produção consistente, com situações propícias e coadjuvantes colaborativos – incluindo uma participação especial de Uma Thurman. A edição do filme também ajuda consideravelmente, uma vez que há cenas um bocado difíceis que precisam de realismo e o timing perfeito para nos convencer de que tudo é real.

E falando em apreciar um bom filme de violência, eis aqui um ponto interessante de “A Casa que Jack construiu”: uma obra talvez quase desnecessária (se julgarmos que não há um vilão e um bandido), mas que nos chama a atenção pelo teor exagerado de brutalidade. E por que gostamos de filmes assim? Eu não sei, talvez seja a sensação de impotência, pânico ou angústia, mas algo muito forte prende nossa atenção.

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Nesta obra em específico, o cineasta nos dá boas razões porque gostamos de ver tal tipo de arte, sendo que uma delas é a possibilidade de apreciar a incrível burrice humana. Outro motivo é a nossa admiração pelos mistérios da mente, que aqui se acentuam num nível extraordinário. Enfim, há várias lições e argumentações muito válidas neste longa-metragem, que merecem nossa atenção.

Muita gente não vai ver graça ou qualquer razão para ver este filme, porém eu acho que os aficionados por serial killers e os fãs do diretor vão encontrar aqui um prato cheio de sanguinolência para degustar com calma. Há muitas cenas e ideias geniais, que você certamente vai precisar curtir no cinema para aproveitar toda a maestria de Lars von Trier.

Toy Story 4 | Novo trailer dublado e sinopse

Woody, Buzz, Jesse e toda a turma vivem felizes, agora como brinquedos da pequena Bonnie. Entretanto, a chegada de um garfo transformado em brinquedo, Forky, faz com que a calmaria reinante chegue ao fim, justamente porque ele não se aceita como brinquedo.

Crítica do filme Bohemian Rhapsody | Uma celebração ao Queen

Contar a cinebiografia de uma das bandas mais marcantes da história do rock não é uma tarefa simples, e por isso mesmo diversos contratempos em uma produção dessas já eram de se esperar. “Bohemian Rhapsody” conta a trajetória de Queen, e inevitavelmente uma figura tão carismática e espirituosa quanto o vocalista Freddie Mercury se sobressai, o que torna ainda mais difícil representar uma personalidade tão complexa sem ofender os fãs.

Para tal feito, o diretor Bryan Singer foi escalado, mas acabou sendo substituído por Dexter Fletcher  após simplesmente deixar de comparecer aos sets de gravação, ainda que Singer tenha seu nome mantido como diretor e Fletcher como produtor executivo. Já o roteiro é assinado por Anthony McCarten, com os devidos aconselhamentos dos produtores e mebros da banda Brian May e Roger Taylor.

O filme narra a rápida ascensão de Freddie Mercury (Rami Malek) e da banda Queen ao sucesso. Nascido Farrokh Bulsara, o jovem descendente de persas de aparência distinta, com mullets e dentes proeminentes vai de carregador de bagagens no aeroporto Heathrow a vocalista e co-fundador da banda após um show da Smile, onde conhece o estudante de astrofísica e guitarrista Brian May (Gwilym Lee) e o estudante de odontologia e baterista Roger Taylor (Ben Hardy). Freddie demonstra que apesar da aparência peculiar, ele possui uma voz poderosa ao cantar para os músicos em um estacionamento. Rapidamente a banda já está formada e se apresentando, com a adição de John Deacon (Joseph Mazzello) no baixo, a voz e carisma de Mercury como vocalista principal, Smile se tornaria Queen.

Quem quer viver para sempre?

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É importante ressaltar que o longa se sustenta mais como homenagem aos fãs do que propriamente uma história biográfica. Todos os grandes momentos da banda são pontuados, mas nunca aprofundados e com uma certa liberdade poética quanto aos fatos, apenas para a história se desenrolar de uma forma mais atrativa. Quem já conhece a trajetória da banda vai sentir em “Bohemian Rhapsody” exatamente o que esperava, entendendo o motivo, ainda que por vezes oculto, de cada uma das cenas escolhidas. Infelizmente isso pode ser confuso para quem não faz ideia de quem seja essa gente, e nesse sentido dificilmente o filme vai agradar quem esteja assistindo por qualquer motivo além da homenagem a banda em si.

Os detalhes da vida pessoal de Mercury são apenas superficiais e muitas vezes buscando um moralismo desnecessário e reforçando estereótipos. Inicialmente, seria Sacha Baron Cohen o escolhido para encarnar Freddie Mercury, sobretudo pela semelhança física. O papel acabou ficando com Rami Malek após Cohen ter discordado das ideias que a banda tinha para o roteiro. Ele gostaria que a história contasse mais sobre a vida pessoal de Mercury, o que envolveria cenas recomendadas para maiores de 18 anos, enquanto o roteiro final foca na trajetória profissional do cantor. Além disso, o guitarrista Brian May, que juntamente com o baterista Roger Taylor produziram o longa, gostaria que o filme mostrasse a trajetória do Queen após a morte de Freddie Mercury, algo que desagradou muito Cohen e que felizmente foi revisto no roteiro final.

Apesar de toda a desinibição e energia nos palcos, Mercury se mostra bastante contido e meio tímido quando não está cantando. Ele conhece, se apaixona e tem um relacionamento com Mary Austin (Lucy Boynton), ao mesmo tempo em que luta com sua crescente atração por homens. Ao compor e cantar “Love of My Life” para demonstrar seu amor, o sentimento parece genuíno tanto para Malek quanto para Boynton, devido a carga emocional que ambos colocaram em seus respectivos papéis, algo que transparece tanto na história real quanto na cinebiografia.

Porém, não há a mesma sensação durante as cenas onde Mercury passa a viver abertamente sua homosexualidade ao lado de Paul (Allen Leech) de forma hedonista, vivendo em festas e orgias. Falta autenticidade, em parte pela restrição etária do filme mas principalmente por medo de ser desrespeitoso com os fãs. Ambos, porém, são eficientes para expor o que há de melhor e pior em Mercury, já que, enquanto Mary sempre põe o protagonista em situações que o desafiam a amadurecer e evoluir como ser humano, Paul sempre infla seu ego e o coloca contra todos que ama, principalmente a banda.

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As músicas estão aqui para preencher os vazios no roteiro, impossível não se emocionar cada vez que uma canção começa. Nada disso seria possível sem a dedicação dos atores em dar vida aos integrantes da banda, e Malek se destaca ao entrar de cabeça em cada situação da vida de Mercury, não apenas imitando seus gestos, mas entendendo as razões que o levaram a ser essa figura tão singular.

Talvez Malek não seja exatamente igual ao cantor, mas toda a dedicação convence bastante. As músicas são cantadas por Malek e mixadas posteriormente com a voz de Mercury, assim como todos os instrumentos para os demais integrantes. Em nenhum momento soa como playback ou karaoke, mesmo prestando muita atenção e procurando erros na sincronia. Malek utiliza uma prótese para simular os quatro incisivos extras que concediam a Mercury um alcance vocal maior, detalhe indispensável para representar a figura do vocalista.

Durante os shows, Malek concede perfeição ao papel, tanto na irreverência quanto na aparência. “We Are the Champions”, “We Will Rock You”, “Radio Ga Ga”, cada composição marcando um momento distinto tanto da vida pessoal do vocalista quanto o progresso de Queen como banda. A criação de “Bohemian Rhapsody”. canção de “longos” seis minutos que mistura gêneros como rock e opera é um dos pontos mais divertidos do filme, contando com a participação de Mike Myers como executivo da EMI Ray Foster, possivelmente baseado em Roy Featherstone. Ray afirma que ninguém nunca tocaria Queen enquanto dirige, e ele não poderia estar mais errado.

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O clímax fica por conta da recriação do famoso show de 20 minutos durante o Live Aid de 1985 no London’s Wembley Stadium, considerado por muitos uma das melhores performances da história do rock. É preciso aplaudir os efeitos especiais necessários para criar um mar de gente cantando em coro com a banda. Durante a produção do longa, foi solicitado para que os fãs mandassem versões das músicas do Queen para serem mixadas e utilizadas na platéia, e o resultado não poderia ser mais perfeito.

Apesar de ser meio óbvio, se você tem algum interesse em assistir “Bohemian Rhapsody” no cinema, vale a pena investir em um cinema que tenha uma qualidade de som excelente, e para esse propósito o formato IMAX é uma ótima pedida. As cenas durante os shows capturam toda a famosa interação do público com a banda, cada grito, aplauso e sentimento podem ser sentidos ali.

Exatamente por essa razão todos os possíveis defeitos que essa cinebiografia possam apresentar são totalmente irrelevantes durante as performances musicais. Se for para botar defeito mesmo, eu acredito que deveriam focar ainda mais nas músicas, não apenas utilizá-las para demonstrar determinada situação temporal da vida dos integrantes. A história de Freddie Mercury continuou até 1991, onde ele infelizmente veio a falecer por conta da AIDS, porém “Bohemian Rhapsody” se limita em encerrar no estrondoso show de 1985, contando apenas com fotos e texto antes dos créditos rolarem. De qualquer forma, é uma ótima pedida para os fãs da banda e uma forma de entretenimento extremamente satisfatória.

Critica do filme Halloween (2018) | Chegou a hora de encarar o destino

Todos receberam a notícia de que a Blumhouse estava trabalhando em uma nova edição da franquia Halloween com muita alegria. A produtora que criou um “império do terror" prova constantemente que realmente entede do assunto e a ideia de trazer um clássico como Halloween, A Noite do Terror poderia ser uma ótima oportunidade para uma nova geração de fãs entenderem o apelo da obra de John Carpenter.

Conforme detalhes da produção foram emergindo a expectativa foi aumentando. Primeiro a confirmação de que John Carpenter estaria diretamente envolvido — como compositor, produtor-executivo e consultor criativo. Depois veio a revelação de que Jamie Lee Curtis e Nick Castle voltariam para seus papéis como Laurie Strode e Michael Myers. Por fim a informação de que não se trataria de outra refilmagem, mas de uma sequência direta do filme original, desconsiderando totalmente a dezena de títulos subsequentes que o seguiram ao longo dos últimos 40 anos.

A produção certamente chamou a atenção dos fãs, mas será que o produto final realmente alcançou toda a expectativa? A resposta é não, o que não significa dizer que o novo Halloween é um filme ruim, mas o prisma nostálgico e a falta de inovação não atingem os anseios da maioria dos fãs (ou, pelo menos, os meus) que esperavam um retorno triunfal de uma das maiores Scream Queens do cinema e seu perseguidor implacável.

Enterrando o passado

Halloween (2018) e uma continuação direta do filme original, lá de 1978,  e comeca depois dos eventos da fatídica noite de terror em que Michael Myers saiu em um rompante homicida. Dezesseis anos se passaram e com o maníaco preso em uma instituição mental, uma equipe britânica de documentaristas vem aos Estados Unidos para gravar seu podcast em uma série de reportagens sobre Michael Myers e suas vítimas.

Depois de um encontro pouco produtivo com Myers e seu novo psiquiatra, Dr. Sartain (Haluk Bilginer) — que assumiu os cuidados de Michael depois da morte do Dr. Loomis — a dupla resolve entrevistar o outro lado dessa psicose, Laurie Strode (Jamie Lee Curtis). Depois de sobreviver ao ataque, a garota desenvolveu uma paranoia que obviamente afetou, e ainda afeta, toda e qualquer forma de relacionamento, especialmente com sua filha Karen (Judy Greer) e neta Allyson (Andi Matichak). Reclusa, Laurie treina e prepara a sua casamata na qual espera sempre alerta por um eventual retorno de seu atormentador.

Como era de se esperar, bem a tempo da noite do Dia das Bruxas, Michael Myers escapa da prisão e retoma seu caminho de sangue até Laurie, deixando uma boa quantidade de corpos pelo caminho. Agora, Laurie e sua família tem que encarar o seu maior medo, o retorno do bicho-papão em pessoa, Michael Myers, o monolítico psicopata silencioso com a sua máscara inexpressiva de William Shatner.

Você já tem nosso cartão C&A?

Enterrados no passado

O roteiro de Jeff Fradley, Danny McBride e David Gordon Green (que também assina a direção) não é nenhuma pérola do cinema de terror, mas passa longe de ser um fracasso total. Na verdade, ao longo da primeira meia hora, o filme entrega vários conceitos interessantes que por si só já renderiam histórias inteligentes.

Um bom exemplo é a forma como a violência da noite de terror afetou os envolvidos, notadamente vítima e agressor. As feridas de Laurie são muito mais profundas do que cortes e hematomas e a própria ideia de que, para os padrões atuais, Michael Myers não parece tão chocante — como um dos personagens filme propõem.

Afinal, cinco mortes não soam tão horripilantes para jovens millenials que convivem com notícias de seus próprios colegas armados invadindo salas de aula e fuzilando dezenas de crianças de uma só vez. Os tempos mudaram, a violência mudou. Como a “maldade” inerente de Myers é discutida nesse cenário? Qual é a verdadeira motivação de Myers?

Não tem ninguém aqui...

O grande problema do roteiro escrito pelo trio é que todas essas ideias, e outras, não são nem um pouco exploradas. O filme não define qual é o seu verdadeiro foco, trocando entre Laurie e Myers e não se aprofundando em nenhum. Qualquer discussão sobre o próprio gênero slasher é evadida com algumas mortes gráficas ou um momento de drama familiar mal encaixado. O relacionamento de Laurie com sua filha, neta e o próprio Michael Myers é uma discussão realmente interessante que é sumariamente jogada de lado.

De positivo, o momento de empoderamento intergeracional feminino, colocando mãe, filha e neta juntas para superar um terror do passado. No fim, não há nada de novo no fronte, Halloween (2018) tem algumas boas ideias, mas se quer se dá ao trabalho de explorar elas. Uma pena haja vista que tecnicamente, a direção de David Gordon Green traz alguns elementos muito interessantes na fotografia, no ritmo (obviamente inspirado no estilo de Carpenter) e especialmente no plano sequência que acompanha um dos ataques de Michael.

Outro ponto excepcional do filme é a trilha sonora. Como dito anteriormente, o próprio John Carpenter, ao lado de seu filho, Cody Carpenter e de Daniel Davies, trazem todos os sons que marcaram a franquia. Combinando novos arranjos, amplificando velhas partituras e criando algo singular. Os sintetizadores literalmente ditam o tom do filme.

Nossa miga errei toda a base, tá  branca e craquelada

Desenterrando

Longe de ser a prior iteração da franquia, Halloween (2018) é um filme mediano que não alcança todo seu potencial. Dentro dos slasher é uma adição interessante, mas que não é suficientemente assustador, enérgico ou, até mesmo, engraçado.

Fica evidente a necessidade de se reinventar essas franquias, simplesmente mostrar psicopatas esquartejando vítimas não é suficiente para prender a atenção do espectador. Alguns sustos são sempre bem vindos, mas mesmo em um gênero tão visceral quanto o slasher é preciso explorar novas ideais. Todas as histórias já foram contadas, basta encontrarmos novas maneiras de contá-las.

Halloween (2018) enterra o passado sem causar traumas ou lamúrias

Se você é um fã ardoroso e espera algo tão impactante quanto o original certamente sairá do cinema decepcionado. Todavia, o que é apresentado uma espécie de enterro honroso para uma das maiores franquias de terror do cinema. Obviamente ainda vamos ver alguma outra forma de iteração da série Halloween, mas esse filme consegue deixar o passado para trás sem causar indignação nos fãs da velha-guarda, ao mesmo tempo em que abre caminho para reinvenções. 

Crítica do filme Venom | Uma simbiose entre bom e ruim

Mais um filme baseado em quadrinhos, para a alegria dos fãs. “Venom” é uma aposta bem arriscada de pegar carona no Universo Cinematográfico Marvel, em que a Sony utiliza os direitos dos personagens (secundários e que quase ninguém se importa) para criar seu próprio mundo de “heróis”.

Venom é um dos vilões mais icônicos do Homem-Aranha, muito popular nas histórias em quadrinhos e permeando o universo Marvel de diversas formas. O principal desafio de produzir esse filme era pegar um vilão extremamente vinculado ao Aranha e desassociar os dois, contando uma origem independente, para então transformá-lo em anti-herói em apenas um longa. Essa missão quase impossível foi bem sucedida?

Nós somos Venom?

O problema não seria tão grande se toda a origem do personagem não fosse baseada nos poderes e ódio mútuo de Eddie Brock e Venom contra Peter Parker/Cabeça de Teia. Porém, para quem estava esperando uma inserção no universo Marvel, ou mesmo uma breve aparição do Homem-Aranha, pode esquecer, ele nem ao menos é mencionado.

Os arcos das histórias em quadrinhos “Protetor Letal” e “Planeta dos Simbiontes” foram inspirações declaradas, e para quem curtiu o filme (sério?) ou pelo menos se interessou pelo personagem, vale a pena buscar pela fonte original. Os roteiristas Scott Rosenberg e Jeff Pinkner fizeram todos os milagres possíveis, mas infelizmente os milagres vão até onde os direitos da Sony acabam. É visível o esforço em introduzir detalhes e personagens conhecidos dos fãs mais fervorosos para justificar essa bagunça, mas o melhor mesmo é esquecer tudo que você sabe sobre Venom e apenas assistir sem pretensão.

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O início do filme é atropelado, conhecemos Eddie Brock (Tom Hardy), um repórter investigativo relativamente competente, mas impulsivo e meio sem noção. Ele está em um noivado com Anne Weying (Michelle Williams), uma advogada que representa a Fundação Vida.

Entre tecnologia avançada, indústria farmacêutica e pesquisa e exploração espacial, a Fundação Vida é encabeçada por Carlton Drake (Riz Ahmed), um jovem gênio milionário que aparenta ser uma boa pessoa mas possui desvios éticos preocupantes. O fato é que a Fundação encontrou vida fora da Terra e conseguiu trazer para cá, mas elas precisam de um hospedeiro para sobreviver no nosso planeta, o que pode ser chamado de parasita, mas como isso é ofensivo para essas formas de vida eles preferem o termo “simbionte”, sugerindo um benefício mútuo.

O roteiro é absurdamente fraco, com diversas situações convenientes e que nem são tão relevantes para a história. Em filmes deste gênero é sensato ter um bom nível de suspensão de crença, mas “Venom” abusa. Não é nem necessário pontuar esses buracos, já que é claro o desleixo apenas para que cenas específicas aconteçam.

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A sensação é de que são dois filmes distintos. Em um deles, todos os atores tentam entregar um papel coerente e “sério”, enquanto no outro Tom Hardy parece estar possuído, atuando em um filme de paródia pastelão digno da Sessão da Tarde. E por incrível que pareça, essa é a graça do filme. Toda a relação e descobertas de Venom e Brock são bastante engraçadas, os diálogos internos e principalmente as cenas de ação são a única razão do longa ser “assistível”.

A atuação de Michelle Williams é um bom contraponto para Hardy, apesar da personagem feminina que serve de mãe e esposa. Riz Ahmed rouba a cena sempre que aparece, mas suas motivações são tão rasas quanto o roteiro do filme, assim como todos os outros personagens secundários. É melhor focar só nas cenas de ação e no humor ocasional mesmo.

Aparentemente o diretor Ruben Fleischer apenas seguiu a risca o que a Sony exigiu para o longa. Com uma fotografia sombria, talvez buscando um possível clima de terror ou algo mais “maduro”, fugindo do colorido tradicional dos super heróis. Porém, destoa totalmente do clima do filme.

Mas Fleischer acerta nos efeitos especiais e cenas de ação, com cenas claras e sem cortes desnecessários, explorando o potencial dos poderes dos simbiontes tanto na aparência quanto nas lutas, tudo bem orgânico, diferente da terrível versão de Sam Reimi em Homem Aranha 3. Apesar de que em diversos momentos Venom devora pessoas pela cabeça, consumindo totalmente o corpo em questão de segundos, porém é compreensível que isso seja mais um alívio cômico do que um erro propriamente dito.

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Esse é o possível começo de um universo da Sony com personagens secundários que ninguém liga, já que Tom Hardy tem contrato para três filmes como Venom, porém nada é certo. Há uma cena pós-crédito que serve mais como um agrado aos fãs do que uma chance real de uma sequência interessante, mas isso só o futuro (e a bilheteria) dirá.

A última cena pós-crédito não tem relação com o filme, mas mostra um trecho da animação "Homem-Aranha no Aranhaverso”  essa sim uma abordagem do aracnídeo que deve agradar todos os fãs.

Enfim, “Venom” não deve ser tomado como uma obra de arte indispensável, mas um entretenimento leve e despretensioso. Com todos os seus defeitos, ao menos não é cansativo e diverte até o final, exatamente como um filme de heróis deve ser.