Stan Lee - Café com Filme

Critica do filme Doutor Sono | O Mundo é um lugar faminto

Doutor Sono agrada, mas não encanta. O grande problema do filme é que, por mais injusto que seja, ele deve ser diretamente comparado com as obras de Stephen King e o filme O Iluminado de Stanley Kubrick. A comparação é necessária não apenas por se tratar de uma sequencia da história, mas por conta de todas as diferenças da controversa adaptação de Kubrick, até hoje execrada por King e celebrada por cinéfilos. Assim, é necessário antes de qualquer coisa se posicionar como uma sequencia do livro ou do filme, algo que Mike Flanagan não consegue definir ao longo de toda a película.

Caso você seja capaz de olhar para além do clássico talvez Doutor Sono pareça de fato melhor do que realente é. Sem desmerecer o trabalho de Flanagan — que já mostrou capacidade com o gênero na boa adaptação de Jogo Perigoso e no excelente A Maldição da Residência Hill — ele não é nenhum Kubrick e suas escolhas empurram o filme mais a aventura fantástica do que para o suspense sobrenatural.

De maneira encapsulada, Doutor Sono é interessante, mesmo que não acerte em cheio os fãs de terror. A história de King cria uma mitologia própria ao mesmo tempo em que revisita os demônios exorcizados em O Iluminado. O filme acerta o ritmo, mas perde boas chances de se tonar algo maior. Com pouco mais de duas horas e meia é um filme se mantém ágil, mas sem apresentar muito conteúdo.

No final, ficamos com a sensação de que, seja em seu formato literário, ou como uma grande adaptação cinematográfica hollywoodiana, O Iluminado não precisava de uma continuação.

Fantasmas do passado

Após os acontecimentos do Hotel Overlook, Danny Torrance e sua mãe se mudam para Flórida, mas os fantasmas seguem atormentando o garoto. Até que o espírito de Dick Hallorann surge para ensinar Danny a utilizar seus poderes psíquicos para conter as assombrações. Nesse tempo, somos apresentados a Rose Cartola a líder do Verdadeiro Nó, uma guilda de seres quase-imortais que se alimentam da essência de pessoas “iluminadas” como Danny.

Quase trinta anos se passaram desde a morte de seu pai Jack no hotel Overllok, mas Danny ainda sofre com outros fantasmas do passado, o legado de alcoolismo e temperamento violento de seu pai. Tentando fugir desses demônios pessoais, Danny vaga pelo interior dos Estados Unidos, até o dia em que chega à pequena cidade de Frazier, onde parece encontrar um lugar de paz tanto física e emocionalmente.

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Danny trabalha em uma clínica de cuidados paliativos, onde utiliza seus poderes para ajudar pacientes terminais a morrer em paz com tranquilidade, quando descobre a existência de Abra Stone, uma garotinha “iluminada” que mantém contato psíquico com ele.

O que era apenas uma “amizade a distância” é forçada quando Rosie e o Verdadeiro Nó descobrem a existência de Abra e, atraídos pelo tremendo poder da garota, começam uma caçada sobrenatural para consumir a essência dela.

A trama possui vários elementos interessantes e o trabalho de Flanagan torna tudo muito ágil, apenas do filme rodar por mais de duas horas e meia. O problema aqui é que, mesmo com todo esse tempo de duração, o filme não consegue explorar os pontos mais interessantes da obra, como os membros do Verdadeiro Nó e, principalmente, o relacionamento de Danny com seu pai.

Um mundo iluminado

Por incrível que pareça Ewan McGregor (Danny Torrence), maior nome da película, não é o grande destaque do filme. Operando em baixa rotação, talvez por escolha criativa do ator para evocar o cansaço mental do personagem, McGregor não brilha tanto quanto suas companheiras de tela, Rebecca Ferguson (Rose Cartola) e Kyliegh Curran (Abra Stone).

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Ferguson que passou a chamar a atenção depois de aparecer nos últimos dois filmes da franquia Missão: Impossível entrega uma personagem intrigante que cativa o espectador apesar de seus atos perversos. Enquanto isso, Kyliegh Curran se destaca com sua confiança (que beira a arrogância) em um equilibro que mistura elementos de ambas as personagens e ainda sim emana inocência.

Sem entrar em detalhes da trama e estragar eventuais surpresas da história, é uma pena que, nem mesmo nos flashbacks, não tenha sido utilizados modelos dos atores originas de O Iluminado, dito isso, Carl Lumbly, Alex Essoe e Henry Thomas fazem um bom trabalho na pele de personagens que foram eternizados por Scatman Crothers, Shelley Duvall e Joe Turkel. Fica também o destaque para ótima cena de Jacob Tremblay que em poucos minutos de cena dá um tom muito mais sinistro a todo o filme, desencadeando toda a trama.

Se a sua estrela não brilha, não tente apagar a minha

A verdade é que Mike Flanagan não faz nada muito errado, mas também não apresenta nenhum acerto sensacional. O filme se desenvolve com relativa agilidade e não se torna enfadonho em nenhum momento — há sempre algo acontecendo na tela para prender a atenção. Alguns truques bem elaborados do diretor, que também assina o roteiro, criam imagens inteligentes para a representação dos poderes psíquicos dos iluminados e do Verdadeiro Nó.

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O problema de Doutor Sono é bem mais simples e impossível de ser contornado, não se trata de um filme de Stanley Kubrik. Além disso, apesar da fala de Flanagan, o filme não se posiciona definitivamente como sequencia do livro ou do filme. É preciso entender as diferenças criativas por trás de cada obra e isso guia sim o desenvolvimento de uma continuação.

Doutor Sono não é ruim, mas não empolga. Falta o tempero kubrickiano e umas pitadas de Nicholson para dar sabor ao filme

King escreve O Iluminado e o descreve como uma de suas obras mais autobiográficas, tendo concebido o livro enquanto ele próprio lutava contra o alcoolismo em um hotel muito similar ao Overlook. Enquanto a produção de Kubrick é tão complexa que existem filmes sobre o filme e seus significados.

Ao tentar agradar ambos os lados o filme peca por não encontrar a sua própria identidade, parecendo algo estéril. Doutor Sono é um bom filme e certamente encontrará um público cativo, mas nunca terá o mesmo apelo que o original.

O Anjo de Auschwitz | Trailer legendado e sinopse

Esta é a história de uma parteira polonesa que, depois de ser feita prisioneira e levada para campo de Auschwitz, é recrutada pelo Dr. Mengele, médico nazista, para trabalhar no hospital com ele. Quando ela descobre os sádicos experimentos que são realizados no local, particularmente em grávidas e crianças, a parteira decide salvar o máximo de vidas que conseguir. Esta é a incrível e inspiradora história de Stanislawa Leszczynska, mulher responsável por salvar mais de 3 mil bebês em partos nas piores condições possíveis e ganhar o nome de “O Anjo de Auschwitz”.

Crítica do Filme Projeto Gemini | Um maluco em pedaços

Sob a batuta de Ang Lee, diretor oscarizado de O Segredo de Brokeback Mountain, estrelado pelo multipremiado Will Smith, e sob os cuidados do mega-produtor arrasa-quarteirão e manjador mor dos paranaue, Jerry Bruckheimer , Projeto Gemini parece destinado ao sucesso... Certo?

Apostando em efeitos especiais de alta qualidade e uma nova tecnologia de cinematografia de altíssima definição, o filme entrega o que promete, mas não coloca nenhum adereço na embalagem. O roteiro raso (e um tanto datado) e a direção receosa de Ang Lee não exploram todo o potencial da película, que mesmo assim ainda agrada sem fazer muito esforço.

Com o perdão da brincadeira, em um mar de filmes clones sem qualquer inovação real, qualquer vestígio de criatividade deve ser celebrado e em Projeto Gemini existe muita criatividade por trás das câmeras, infelizmente nem todas essas ideias aparecem na frente das lentes, o que reduz toda a produção a mais um filme de ação. Sem qualquer demérito ao gênero, fica a ressalva de que, mesmo sendo um bom filme de ação, Projeto Gemini não alcança todo seu potencial.

Um maluco no encalço

Rodando por Hollywood desde 1997, a trama de Projeto Gemini parecia muito mais interessante na época em que foi concebida pelo roteirista Darren Lemke do que agora, mais de vinte anos e algumas revisões depois. Como era de se esperar de uma obra que foi reescrita por diferentes mãos, incluindo David Benioff (de Game of Thrones), o produto final sofre de uma esquizofrenia narrativa que afeta em muito o desenvolvimento da história.

Em Projeto Gemini acompanhamos Henry Brogan (Will Smith) um operativo de elite de uma agência de inteligência governamental. O problema é que a idade chega para todo mundo e Henry, um cinquentão, já não conta com os mesmos reflexos da sua juventude. Ciente de suas limitações, ele resolve entrar com o pedido de aposentadoria (antes que a reforma da previdência coloque ele na linha de tiro).

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Infelizmente, o trabalho de Henry não conta com muitos direitos trabalhistas e um de seus ex-comandantes, Clay Verris (Clive Owen) não aceita muito bem a ideia de ter uma “ponta solta” como Brogan andando por ai sabendo o que ele sabe sobre o submundo da espionagem internacional, desencadeando assim uma série de tentativas de eliminar essa ameaça.

Agora, com um assassino de elite em seu encalço, Brogan, acompanhado de Danny Zakarweski (Mary Elizabeth Winstead), uma agente infiltrada, ele sai fugindo mundo afora acionando seus velhos contatos e antigos amigos de profissão.  A coisa fica ainda mais confusa quando Brogan descobre que a pessoa que está em seu encalço é, na verdade, seu clone.

Apesar de apresentar conceitos interessantes, tudo parece desprovido de personalidade, derivativo.  Na década de noventa poderia ter sido muito mais original vermos a história de um assassino veterano sendo caçado/traído pelo seu empregador/governo/parceiro. Atualmente, mesmo com a adição da reviravolta do oponente ser uma versão mais jovem de si, pouco se acrescenta ao extenso elenco de produções do gênero.

Uma pena, haja vista o potencial do elenco, direção e tecnologia por trás de Projeto Gemini. O talento de Ang Lee certamente poderia explorar o alcance dramático de Will Smith levando o que seria um mais um filme de ação em um título mais denso, cativante e até mesmo introspectivo.

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Olho no lance

Poderíamos falar por horas a fio do feito tecnológico por trás de Projeto Gemini.  Apostando em um salto tecnológico, o diretor Ang Lee, que já havia flertado com o cinema de altíssima definição com A Longa Caminhada de Billy Lynn — rodado em 4K e 3D com uma taxa altíssima de quadros por segundo — entrega um filme com efeitos filmados a impressionantes 120fps (no que foi batizado de 3D+).

Essa técnica deixa toda a experiência cinematográfica muito mais fluída, além de oferecer uma sensação de profundidade mais nítida aos efeitos 3D. Se esta tecnologia é, o não é, o futuro da fotografia no cinema ainda vamos ver, mas Projeto Gemini certamente se beneficia desse trunfo.

Além disso, também merece destaque o rejuvenescimento digital de Will Smith. O construto, totalmente virtual, é impressionante e só apresenta defeitos quando superexposto. Em outras palavras, se você pretende ver Projeto Gemini faça isso em uma sala que suporte o 3D+.

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Big Willie Style

Ang Lee não acrescenta os efeitos e tecnologia apenas pela extravagância técnica. O diretor explora o sistema, experimentando novas possibilidades e estilos possibilitados pela ferramenta. Com um personagem protagonista totalmente digital criado a partir da captura de movimentos, o diretor consegue colocar o ator frente a frente com sua contraparte rejuvenescida de maneira muito convincente.

A ressalva quanto à direção de Ang Lee é justamente por conta do que ele nos apresenta como possibilidade, mas não engaja o suficiente dentro do filme. Tecnicamente, o diretor comanda o filme de maneira inteligente, mas não explora seu maior recurso, Will Smith e o resto do elenco.  Mary Elizabeth Winstead tem um grande momento no filme, mas é pouco utilizada dentro da trama, enquanto Clive Owen entrega uma atuação descompromissada e extremamente caricata. Por sua vez, Will Smith age no piloto automático, entregando uma atuação consistente, mas pouco elaborada.

Parece que dois Will Smith não são suficientes para carregar um filme inteiro

O alcance dramático de Will, que já lhe rendeu duas indicações ao Oscar poderia explorar até mesmo uma faceta existencialista dentro do filme, vereda que acrescentaria muito mais consistência ao título, que se contenta em entregar releituras de filmes de ação dos anos 90. Projeto Gemini tem boas cenas de ação — com destaque para a sequencia nas ruas de Cartagena e o "bike-fu" de Will Smith — e para expremer todo o suco é melhor assistir em uma grande tela com o sistema 3D+

Crítica do filme Ad Astra - Rumo às Estrelas | Uma longa jornada pessoal

Há um certo encanto nos filmes que é difícil de descrever, uma atmosfera hipnotizante que nos mantêm vidrados por horas contemplando existências fictícias. Boa parte desse encanto provêm de excelentes atores e atrizes que tanto amamos, como Brad Pitt.

Como protagonista dessa aventura espacial, a escolha desse magnífico ator é bastante acertada, pois os adjetivos e elogios servem tanto para ele quanto para “Ad Astra – Rumo às Estrelas". É fácil notar que tudo que estamos presenciando é a partir do ponto de vista do protagonista, desde seus pensamentos e avaliações psicológicas até momentos de extrema tensão em que ele se mantém plácido e extremamente eficaz na resolução dos problemas, tanto físicos quanto filosóficos.

James Gray assina a direção e co-escreveu o roteiro com Ethan Gross em um longa que assim como a performance de Brad Pitt, é bastante controlado e contemplativo, ainda que possua boas doses de adrenalina e desespero em momentos chave. Há uma familiaridade em “Ad Astra”, obviamente devido a todos os filmes sobre exploração espacial, mas também há uma certa particularidade que torna o filme um misto de realidade e ficção, uma espécie de sonho lúcido de um futuro próximo que talvez nunca aconteça.

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A sequência inicial já impressiona bastante. Após um terrível acidente que passa a ser conhecido como “O Surto”, o major Roy McBride (Brad Pitt) recebe a notícia de que a sobrevivência de nosso planeta está ameaçada graças a uma misteriosa onda de energia que viaja através do espaço.

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Isso pode ter relação com o sumiço de seu pai, Clifford McBride (Tommy Lee Jones), um astronauta dedicado a encontrar vida inteligente fora da Terra. Agora sua missão é viajar em direção ao espaço profundo e solucionar esse mistério, com segredos que podem ameaçar a existência humana.

A trama se passa em “um futuro próximo”, deixando propositalmente em aberto os eventos que o filme retrata. Apesar de ter um os pés bem firmes no chão e ser incomodamente semelhante a nossa realidade, “Ad Astra” possui muitas liberdades poéticas nas questões científicas.

Isso já foi abordado por diversos cientistas em sites sobre o tema, então não compensa comentarmos a respeito. Basta dizer que é tudo bastante convincente, sem os exageros que a ficção científica normalmente se utiliza, simplesmente pelo desenvolvimento da história e o que ela significa. Em “Ad Astra” o que importa é a jornada e não o destino.

Pai, por que me abandonaste?

Praticamente o filme todo é ancorado por Roy. É um personagem cativante, misterioso e totalmente controlado. Além de ser filho de um astronauta admirado como um herói por todos, ele é conhecido por sua capacidade inexplicável de manter-se calmo em situações de extrema tensão, algo que se mantêm ao longo do filme, ou quase isso.

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Ao prestar atenção nos diálogos internos, descobrimos que essa armadura de frieza são resultado do projeto espacial que seu pai iniciou quando Roy ainda era criança e como a dedicação ao trabalho atrapalhou sua vida pessoal. Por fora, ele é calmo, responsável e simpático, mas internamente ele não consegue se relacionar com outras pessoas e vive apenas fugindo de seus conflitos internos e isso tudo transparece na película em detalhes sutis, mas que entregam exatamente o que o protagonista está passando.

Infelizmente, por ser tão focado em Roy, “Ad Astra” nunca explora os outros personagens devidamente. Eve (Liv Tyler), a esposa de Roy, tem no máximo duas falas no filme todo, apesar de ser tão importante para o protagonista. Helen Lantos (Ruth Negga), personagem que lidera a colônia em Marte serve apenas como um facilitador de eventos para Roy, ainda que sua relação com o protagonista seja no mínimo conflitante. A sensação é de que cada um dos personagens pudesse protagonizar um filme a partir de seu ponto de vista, tamanha sua complexidade e subutilização.

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Pode-se dizer que filmes sobre exploração espacial não são novidade, por isso mesmo que “Ad Astra“ chama atenção. Já é tudo familiar, ainda que com suas características próprias e de certa forma, um ângulo diferente. A expectativa sobre o que pode acontecer é tão subvertida que acaba surpreendendo pelo óbvio. Mas a verdade é a que a mensagem que o filme passa é tão impactante que é difícil ficar impassível como Roy. Vale a pena embarcar nessa jornada, tanto pela inspiração quanto pelo entretenimento.

Crítica Era Uma Vez em... Hollywood | O melhor filme de Quentin Tarantino?

Quando falamos em diretores icônicos, não há dúvida de que Quentin Tarantino se destaca em inúmeros rankings, ainda mais tratando dos cineastas mais marcantes das últimas décadas — bom, pelo menos na minha lista, eu acho que ele deve ficar facilmente no Top 5. E se a ideia é pensar no jeito de criar e contar histórias, então Tarantino certamente se destaca por ser um cara de ideias pra lá de inusitadas.

Sempre focado no lado mais absurdo, sanguinário e até sádico do ser humano, Tarantino criou um portfólio que se destaca pelo exagero, seja dos personagens, das situações ou da execução mesmo. Se pegarmos os filmes dele, nenhum tem um viés muito realista, mas é justamente o apelo para o surreal que cria essa conexão com o público. E aí temos inúmeras marcas registradas dele em suas películas.

Ok, talvez você já viu todos os filmes dele ou quem sabe um punhado, mas com tantos títulos de vingança, sarcasmo, perseguição, ação (às vezes, com um bocado de faroeste), o que teria de novidade no filme “Era Uma Vez em... Hollywood”? Oras, se você prestar atenção ao título, a dica fica bem clara: por que não uma pitada disso tudo e uma adição da fantástica fábrica de realidades chamada Hollywood?

Sim, você entendeu direito, este é um filme que se passa nos estúdios de Hollywood, na Los Angeles de 1969. Aqui, acompanhamos as aventuras — nos sets de gravação e na carreira — do astro de TV Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e de seu dublê Cliff Booth (Brad Pitt). Os dois têm de lidar com as mudanças constantes da indústria, o que inclui novos desafios nos papéis de Dalton, e também com as bizarrices da região.

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Essa sinopse provavelmente não diz muito, mas esse é o objetivo. É sempre melhor ver as surpresas na telona. E, SIM, você precisa ver o filme no cinema! Agora, para a outra dúvida: este é o melhor filme de Quentin Tarantino? Essa resposta vai depender de quem avalia, mas, na minha opinião, sim esse é o melhor DE Tarantino, mas não DO Tarantino. Ele não é o mais inovador em história e direção, mas é o que mais tem traços do diretor.

Sabe qual é a minha impressão? Com tanto hype, o cineasta resolveu fazer um filme bem numa pegada exibicionista — até indo na contramão do preciosismo de “Os Oito Odiados”. Aí o resultado é um punhado de coisa genial, mas que não necessariamente agregam para contar a história. O filme que tem suas quase três horas é um deleite para ver DiCaprio e Pitt esbanjando atuação, mas a história mesmo podia ser contada em menos de duas horas.

Isso é um problema? Bom, depende de quem está vendo. Eu achei o filme maravilhoso em cada segundo, porque cada divagação dá um charme a mais e abre espaço para gente curtir toda a genialidade do cara, que adora mostrar seus hobbies na telona (seja vinhetas dos filmes da década de 1960, seja trechos de faroestes, seja a galera hippie da época). Só que para quem gosta de algo mais direto ao ponto, boa parte do filme pode parecer enrolação.

Hollywood como você nunca viu

Você pode ser um grande cinéfilo, ter visto milhares de filmes que tentam retratar a rotina nos bastidores de Hollywood, mas é bem improvável (ou talvez quase impossível) que você já tenha visto algo próximo da visão que Tarantino tem da indústria dos anos 1960. E o motivo para esse ineditismo é bastante óbvio: cada idealizador pode partir para uma abordagem completamente distinta para retratar um mesmo cenário.

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Uma coisa bem legal é que num projeto tão amplo (pois apesar de ser longo, o filme não foca tanto nos detalhes, mas no número de variáveis para contar a história) podemos ter uma ideia bem variada de um mesmo universo. Assim, Tarantino aproveita os dois fios condutores (que são os protagonistas) para mostrar alguns dos tantos profissionais dos estúdios, até dando uma pequena aula das tarefas e peculiaridades, e também dos tipos bizarros da cidade.

É claro que a escolha dos filmes fictícios que existem dentro de “Era Uma Vez em... Hollywood” só podia ser títulos de faroeste — afinal, estamos falando do cara que fez “Django Livre” e “Os Oito Odiados”. E é legal ver que o diretor se preocupou em mostrar tanto versões finalizadas da época quanto os bastidores mesmo, incluindo as rotinas mais simples dos atores da época, com seus desafios até para decorar falas.

Ok, tudo isso pode parecer detalhista, mas pode ficar tranquilo que você não terá uma cena de dez minutos com uma carruagem vindo de longa distância até parar em frente à câmera. Todavia, é interessante colocar que os detalhes aqui são usados de forma mais pontuais e para acrescentar algo à história dos protagonistas. E, aliás, vale pontuar que os personagens fictícios até têm inspirações reais, mas há uma boa dose de invenção aqui.

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Claro, para dar coerência para toda essa ficção, Tarantino retrata uma Hollywood nos mínimos detalhes, numa produção que leva em conta figurino, carros, mansões, lojas e também os figurantes. Tudo é planejado com uma minúcia para garantir que o espectador mergulhe nesse conto de fodas (mesmo que não seja um filme com essa pegada, as ideias do cara são inegavelmente fodas).

É bom ser o Rei!

Como eu já disse, a ideia de “Era Uma Vez em... Hollywood” parece ser uma produção única e exclusivamente para criar um mundo imaginário de Tarantino em sua cidade favorita. Foi ali que o cara teve suas maiores realizações, então é óbvio que ele queira mostrar um pouco do todo que o fez se apaixonar pelo mundo do cinema. Assim, as quase três horas de película são quase que totalmente dedicadas a dar essa degustação ao público.

E, nessa altura do campeonato, Quentin Tarantino pouco se importa se os críticos ou o público não vão gostar de algo, pois ele já tem seu espaço para pintar e bordar como quiser, ainda mais num filme que é totalmente idealizado por ele. Mesmo com algumas ressalvas, é inegável que o cineasta tem muita coisa a mostrar, ainda que tenha várias cenas que o público possa julgar como irrelevante, o homem prefere trabalhar a sua maneira.

Se em outros verões, o diretor já teve suas divagações para criar clima de tensão através de enormes diálogos (quem não lembra daquela cena tensa de “Bastardos Inglórios” com o general fumando seu cachimbo?), aqui ele prefere dar espaço até mesmo para tarefas como o retrato de um cachorro ansioso por sua refeição ou uma atriz admirando sua própria performance no cinema. Tudo isso pode representar pouco no fim da jornada, mas a construção é tão charmosa, que a gente só admira toda essa paixão de Tarantino.

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A influência do cineasta para atrair Leonardo DiCaprio, Brad PittMargot Robbie para um mesmo filme é sensacional. Sério, os dois dominam o filme como se tivessem dando um passeio no parque. É um combo de experiência tão bem acertado, que toda cena vira mágica e a gente fica só admirando os dois se exibindo nos sets de filmagem. Não que os demais atores e atrizes não façam ótimos papéis, mas é inevitável não tecer elogios para a dupla.

E aliás, também é interessante pensar na complexidade desse filme, que por ser um longa-metragem realmente longo, ele teve um trabalho muito maior de produção, ainda mais por contar com outros pequenos filmes inseridos na trama. No fim, parece que a gente tá vendo vários cases e demos que Tarantino tinha guardado na gaveta e tem espaço até para brincadeiras comerciais e participações especiais como a de Bruce Lee (que até gerou polêmica, mas isso não vem ao caso aqui).

E meus amigos, sabe aquele ditado de que “o melhor ficou guardado para o final”? Então, se você tiver paciência, curtir sua pipoca e apenas aproveitar toda essa ficção nos mínimos detalhes, certamente o senhor Tarantino vai se encarregar de entregar sua recompensa da melhor forma possível! O fim da película é algo impagável de bom, então, fique tranquilo, pois você vai sair do cinema bem satisfeito com essa dose tarantinesca.

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Por fim, mas não menos importante, eu acho totalmente válido você conferir “Era Uma Vez em... Hollywood” no cinema, pois — além da direção com maestria — essa talvez seja a penúltima chance de curtir uma obra inédita do cineasta, que já declarou pensar na aposentadoria após o décimo filme (que deve ser o próximo Jornada nas Estrelas). Bom espetáculo para todos!

Crítica Histórias Assustadoras para Contar no Escuro | Explorando o medo obscuro

Eu juro que não sei qual é a dificuldade de alguns idealizadores na hora de criar um filme de terror, afinal só é preciso uma dose de criatividade para bolar algo com uma dose de novidade e que seja no mínimo assustador. E não é preciso reinventar a roda, até porque nem todas as histórias precisam trazer conceitos nunca antes vistos.

É apostando nessa simplicidade que “Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” ganha seu mérito, indo na contramão de vários títulos recentes. Trata-se de um filme com um roteiro relativamente fácil de decifrar, talvez até já bem óbvio para os fãs do gênero, mas que ganha pela ousadia nos rumos da história e também pelo clima de terror bem construído, que aqui se dá através de pequenas histórias.

Os relatos apresentados no filme são de 1968, com a pequena cidade Mill Valley, nos Estados Unidos, como paisagem para o horror atípico. Durante gerações, o legado sombrio da família Bellows cresceu enormemente na região e assombrou o povoado. Segundo reza a lenda, a jovem Sara Bellows aterrorizou a todos com seus segredos e histórias macabras.

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E tudo poderia ser apenas uma lenda, mas os jovens Stella, Auggie e Chuck acabam tendo a infortuna ideia de visitar a casa dos Bellows, agora um lugar abandonado, bem no dia do Halloween. Lá, eles encontrar o livro de Sara Bellows, o que acaba sendo o pesadelo para todos eles. O problema é que este livro torna os mais terríveis pensamentos em monstros reais.

Terror bolado, mas roteiro manjado

Antes do lançamento do filme, eu confesso que imaginei uma trama apresentada mais num formato episódico, com pequenas histórias de terror sem uma conexão. No entanto, há um fio condutor bem interessante no script, que é a leitura do livro e as respectivas maldições transferidas para os protagonistas que foram infelizes de libertar essa maldição.

Sobre as historietas, se você já viu os trailers, é possível que você já tenha uma noção das criaturas do filme. Todavia, se você ainda não viu uma prévia, minha recomendação é não ver absolutamente nada para ter toda a surpresa no cinema. Aliás, é bom ressaltar que essa ideia de fazer contos menores funciona legal, já que os monstros do filme provavelmente não serviriam para um roteiro mais longo mesmo.

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Bom, os contos apresentados no decorrer do filme têm sua dose de ineditismo, que é justamente o que garante uma moral com o público que já conhece todo tipo de lenda do gênero. No entanto, é bom comentar que “Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” peca ao amarrar as pontas, com um desfecho pra lá de clichê.

Felizmente, o filme deixa pra mostrar elementos de repeteco somente no fim da história, sendo que boa parte do desenvolvimento é muito bem dividido entre aquele famoso tour pela cidade (algo bem típico em filmes de terror que precisam de um cenário bem atraente), a apresentação dos personagens, que são bem entusiasmados, e a maldição da casa.

Poderia ser mais assustador...

Com essa dinâmica no script, o andamento do filme é bem coerente, o que faz as quase duas horas de projeção passarem bem rápido. Uma coisa que eu gostei muito é que o filme chega com uma vibe bem à la Stranger Things. Não, não se trata de uma cópia ou nem nada do tipo, mas justamente pela ambientação, a época da história e até os personagens divertidos, é bem provável que você consiga se empolgar facilmente com esse longa-metragem.

Aliás, importante mencionar o cuidado na produção com a parte dos efeitos visuais e sonoros, que casam muito bem e são os responsáveis pelo clima de tensão funcionar tão bem. Fique tranquilo que o filme não apela para a famosa técnica de jump scare. Em vez disso, há uma boa dose de terror mais grotesco, o qual funciona muito bem ao colocar os protagonistas bem de cara com o perigo — e aí pelo excesso de monstros, o capricho visual ajuda muito!

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É justo também pontuar a ótima condução do diretor André Øvredal, que se você gosta de terror já deve conhecê-lo de “A Autópsia” — e só por aí já dá pra saber da qualidade do filme. Com cenas que abusam de loopings infinitos nos cenários, ambientes claustrofóbicos e outros truques no escuro, uma direção bem variada é o que garante o sucesso da película. E a direção de arte ajuda muito, ainda mais em cenas que exploram muito uma mesma tonalidade de cor. Top demais!

Talvez, o único “defeito” relevante de “Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” é que o clima de terror não é tão intenso, uma vez que os protagonistas são bem jovens e o excesso de bichos grotescos impede algo mais amedrontador. No entanto, é possível que alguns espectadores ainda se sintam amedrontados. É isso, um ótimo filme de terror pra ver no escurinho do cinema!