Crítica do filme Hellboy | Como comer o pão que ele amassou

Com todos os defeitos e acertos da duologia dirigida por Guillermo del Toro, "Hellboy" paira na memória dos fãs dos quadrinhos alternativos de Mike Mignola por seu estilo único e visual marcante. Por essa razão, fica fácil presumir que essa nova versão é sem graça. Embora isso seja verdade, a comparação nem é necessária para constatar que o filme individualmente já é um terror, no sentido pejorativo da palavra.

A cena inicial já serve como um aviso da abominação que seguirá. O filme busca respaldo na “inédita” história do Rei Arthur e a Távola Redonda, enfrentando Nimue, a Rainha de Sangue (Milla Jovovich), uma poderosa bruxa que espalhou a peste na Inglaterra. A solução encontrada foi decapitar e desmembrar a moça, separando suas partes por toda a Europa, com uma narração explicando que um dia ela voltará para se vingar dos humanos.

Dessa vez, a encarnação do garoto infernal fica por conta de David Harbour, que conquistou diversos fãs com a série Stranger Things. Ele foi criado por seu pai adotivo Trevor (Ian McShane) e treinado dentro do Bureau de Pesquisas e Defesa Paranormal para combater ameaças sobrenaturais diversas. Para impedir Nimue, Hellboy precisa se aliar a jovem vidente Alice (Sasha Lane) e ao estranho major Ben Daimio (Daniel Dae Kim), enquanto suprime sua natureza demoníaca. 

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Sem coerência alguma, o diretor Neil Marshall parece não ter controle algum sobre o que acontece na tela. Todas as tentativas de humor são falhas, parece aquele seu tio que tenta ser engraçado e as pessoas só dão risada por pena.  Infelizmente o mesmo acontece com as cenas de ação. Em determinada situação (uma ótima contribuição de um roteiro fraco), Hellboy precisa enfrentar um trio de gigantes que se alimentam de carne humana, os efeitos são tão toscos que parecem retirados de uma cutscene de um jogo antigo, infelizmente essa qualidade se mantêm durante o longa.  

Apesar dos problemas em suas produções, Del Toro pelo menos tinha uma impecável concepção de personagens, com uma mescla incrível de efeitos práticos e computação gráfica. Nesse remake, temos apenas demonstrações gratuitas de sangue, vômito, baba e coisas nojentas, com personagens esquecíveis e motivações bobas. Ao inserir esses elementos gráficos é de se esperar que a película seja voltada para um público mais maduro, mas na verdade é só uma história infantil mesmo. 

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Nem mesmo os renomados atores conseguem salvar o longa. Todo o carisma de David Harbour está soterrado embaixo da maquiagem e do roteiro fraco. Ian McShane, possui pouquíssimas falas mas consegue doar uma porcentagem de seu charme em um filme perdido, exceto quando precisa se manifestar através da médium Alice, que manifesta os mortos a partir de sua boca, como se fosse um fantasma feito de entranhas.

Todo a mitologia criada por Mike Mignola está presente na sua forma mais pálida, a maior parte dos conceitos do universo místico de Hellboy são apenas apresentados em diálogos superficiais. Definitivamente esse é um filme que não deveria existir, talvez fosse mais aceitável utilizar todas essas ideias em uma série, já que outro problema é que apesar de ter apenas duas horas ele parece interminável.

Buscando um gancho para uma continuação, o filme finaliza com uma cena pós crédito que mostra um personagem popular, mas que se tudo der certo (para nós) nunca chegará a ser produzida.

Crítica do filme Polar | Se o trabalho não te matar, a aposentadoria vai!

A webcomic/graphic novel Polar chamou a atenção dos fãs de quadrinhos com seus visuais estilizados e narrativa peculiar — que na publicação original não possuía caixas de diálogo e portava apenas três cores (branco, vermelho e laranja). A mistura criativa de uma trama neo-noir, violência exagerada e um protagonista forte logo colocou o nome da produção entre os favoritos para receber uma adaptação para os cinemas.

Sem perder tempo, a Dark Horse Comics anunciou que Polar: Came From the Cold seria adaptado para os cinemas, produzido como uma colaboração entre a divisão de entretenimento da editora (a mesma de O Máscara, Hellboy e 30 dias de Noite) e a Constantin Film. Três anos na gaveta depois, os produtores confirmaram que Mads Mikkelsen estrelaria o thriller de ação, com Jonas Åkerlund (Lords of Chaos) na direção e roteiro de Jayson Rothwell.

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Pouco tempo depois a Netflix entrou como distribuidora e logo foi confirmada a presença de Vanessa Hudgens, Katheryn Winnick e Matt Lucas no elenco. Além disso, também foram adicionados Johnny Knoxville e o veterano Richard Dreyfuss, sem contar que o filme teria uma trilha sonora original produzida pelo DJ canadense Deadmau5.

Parecia que estava tudo bem encaminhado para um lançamento de peso, mas parece que todo o sexo, violência e gracejos visuais não foram suficientes para derreter os corações dos espectadores. Polar não é nada ruim, mas nunca alcança todo seu potencial. Com uma direção dinâmica, mas pouco inspirada e uma trama um tanto batida, fica o destaque apenas para fãs de quadrinhos em busca de algo diferente no catálogo da Netflix.

“Quando eu pensei que estava fora… eles me puxam para dentro”

Duncan Vizla (o excepcional Mads Mikkelsen), também conhecido como Kaiser Negro, é um habilidoso e implacável assassino profissional que está contando os dias para seu aniversário de 50 anos, data que marca o início da sua aposentadoria. Com um plano de aposentadoria generoso provido pelo seu empregador o enojante Sr. Blut (Matt Lucas), Vizla se encontra em um misto de inquietação e conformidade com o seu futuro. 

Entretanto, parece que o Sr. Blut tem uma estratégia financeira diferente e parece que Duncan nunca chegará a sacar a sua polposa pensão. Com uma legião de assassinos extravagantes em sua folha de pagamento, Blut simplesmente prefere despachar seus antigos funcionários, poupando assim eventuais gastos com as aposentadorias.

Assim, não demora muito para que o Kaiser Negro seja forçado de volta a ativa. Escondido na tranquila Triple Oak, Montana, Duncan espera pelo ataque enquanto se aproxima da sua enigmática vizinha, a jovem Camille (Vanessa Hudgens). A trama de Jayson Rothwell não tem o mesmo impacto que o material original, os quadrinhos de Víctor Santos. Mesmo com algumas reviravoltas interessantes, a narrativa depende demais da estilização exagerada dos personagens, algo que funciona nas graphic novel, mas se traduz como "bobo" no filme.

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Ele veio do frio

Saído do universo dos videoclipes musicais, o diretor Jonas Åkerlund mostra muito dinamismo no comando câmera e construção das cenas, no entanto, tudo parece um tanto raso e sem grande impacto. Apesar de contar com muito estilo, principalmente na retratação dos assassinos — alinhado com a extravagância dos quadrinhos — o diretor não consegue imprimir personalidade na sua direção, e no final fica a impressão de estarmos acompanhando uma peça publicitaria ou um videoclipe altamente estilizado.

A trama funciona muito bem nos quadrinhos, e as escolhas narrativa de Víctor Santos são perfeitamente condizentes com a mídia. No entanto, a saga do assassino veterano em busca de vingança já parece um tanto batida e são raras as histórias nesse molde que realmente trazem algo inovador, seja na narrativa ou na ação em si — nem todo mundo acerta como John Wick.

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Mas se há algo que Polar acerta, bem no centro do alvo por sinal, é na escolha de Mads Mikkelsen. O ator fetiche de 9 entre 10 nerds, está primoroso na pele do assassino veterano Duncan Vizla. O estoicismo o próprio das atuações do dinamarquês se ajustam perfeitamente a persona espartana do Kaiser Negro.

Sin City

Polar é um bom filme de ação, com uma trama neo-noir nada inovadora, mesmo que ainda reserve algumas surpresas para o final. O elenco é muito bom com destaque todo especial para as atuações de Mads Mikkelsen e Vanessa Hudgens que tentam trazer mais personalidade para o show visual de Jonas Åkerlund.

Por sinal, Åkerlund faz um trabalho descente em apresentar uma visão estilizada de ação, sexo e violência. O problema é que o diretor falha em fazer isso de uma maneira original, capaz de caracterizar o seu trabalho e não apenas compilar clipes elaborados.

Polar é limitado e perde mais apelo quando comparado a outros títulos; como as caracterizações de Sin City ou a ação de John Wick

No final, Polar não ousa o suficiente para ser lembrado, especialmente com tantas adaptações de quadrinhos análogas com desenvolvimentos muito superiores. Dentro do catálogo de produções da Netflix, Polar ainda mantêm alguma relevância, mas não passa de uma escolha secundária para quem busca algo na mesma linha do ótimo John Wick.

Crítica do filme Cemitério Maldito | Às vezes, morto é melhor

Incrivelmente superior a adaptação original — aquela de baixo orçamento, cujo único elemento relevante é a icônica música dos Ramones —, a refilmagem de Cemitério Maldito (baseado na obra O Cemitério, do mestre Stephen King) acerta o tom, mesmo que descuide de alguns elementos. Fãs da obra literária certamente apontaram as “liberdades criativas” do roteiro que devem incomodar um pouco os mais puristas.

A direção não é inovadora, mas a dupla Kevin Kölsch e Dennis Widmyer, consegue imprimir um ritmo coerente e apresentar uma versão muito mais inteligente do que a pobre rendição lançada em 1989. Quando a direção e o roteiro falham, o elenco — em ótima forma, com destaque especial para o veterano John Lithgow — se supera e ajuda a construir as cenas com emoção e empatia.

O novo Cemitério Maldito é uma boa pedida para os fãs do gênero, e especialmente para os fãs de Stephen King. Mesmo com algumas licenças poéticas na história, o filme marca seu lugar dentro do universo fantástico aterrorizante do autor, fazendo inclusive referências a outras obras do mestre do terror, como o cachorro São Bernardo (Cujo), ou a cidade maldita de Derry (It – A Coisa).

“Simitério de animais”

A trama é basicamente a mesma do livro e da versão original de Cemitério Maldito. O médico Louis Creed se muda com a mulher e dois filhos pequenos para a cidadezinha de Ludlow, Maine. Apesar de aparentemente tranquilo, o novo lar dos Creed fica em frente a uma rodovia movimentada e o extenso quintal abriga uma floresta com um enigmático cemitério de animais.

Creed acaba descobrindo por meio de um vizinho, o simpático velho Crandall, que além do cemitério de animais fica um antigo território indígena com poderes sobrenaturais muito além da sua compreensão. Quando uma tragédia acontece, Creed é obrigado a rever todos seus conceitos sobre vida e morte, ciência e religião, e encarar o poder que emana do local.

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Não vou entrar em detalhes, mas basta dizer que existem sim algumas mudanças na história, seja em relação ao livro ou ao filme de 1989. Na verdade, nenhuma dessas mudanças realmente afeta a narrativa em si e, de certa forma, ainda ajudam a trazer alguma surpresa a uma história já familiar.

O Cemitério é uma das maiores obras de Stephen King e muito desse sucesso reside justamente na forma como o autor trabalha temas tão intensos quanto o luto, loucura e medo. Em todas as adaptações de Cemitério Maldito muito se perde nessa tradução e mesmo quando o próprio Stephen King trabalhou no roteiro, como no caso da versão original de 1989, a sensação ainda é muito aquém daquela experimentada por leitores aflitos que temem todas viradas de página.

Os diretores fazem um esforço para passar toda a claustrofobia da casa dos Creed, cuja loucura cresce conforme são confrontados com a morte e o sobrenatural. O destaque fica por conta da fotografia que utiliza uma paleta de cores que vai "acinzentando" gradualmente até o final.

A maquiagem é precisa — entre o gore e o realismo — criando imagens chocantes, mas nada apelativas. O design do "simitério de animais" é suficientemente sinistro para despertar o medo no espectador, mas infelizmente o mesmo não vale para o verdadeiro cemitério maldito, cuja construção em computação gráfica fica bem abaixo do esperado.  

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Luto emocional

Nessa nova leitura da trama, Matt Greenberg e Jeff Buhler apresentam um texto muito mais inteligente para o cinema. Sem pesar muito a mão em diálogos expositivos, ou grandes monólogos catárticos, o roteiro aposta no equilíbrio de talentos para que as falhas sejam sempre compensadas por outros elementos. Assim, mesmo sem entregar um filme fantástico, os diretores Kevin Kölsch e Dennis Widmyer compõem uma película sólida que não apresenta grandes falhas, o que já é um grande feito por si só.

Mesmo sem se apoiar em sustos ou sanguinolência, Cemitério Maldito é um filme tenso e assustador

Cemitério Maldito é um bom filme que acompanha de perto a história original e ainda apresenta algumas cenas impactantes; especialmente no final que mesmo divergindo do original, ainda se assemelha mais a proposta perturbadora do livro. Com um elenco bem afinado e uma direção cingida, a nova versão de Cemitério Maldito agrada, mas não supera outras produções recentes inspiradas em obras de Stephen King — notadamente It – A Coisa e Jogo Perigoso.

Critica do filme A Menina e o Leão | Coragem, o leão covarde

Apesar de ser uma prática comum na África do Sul, e totalmente legalizada, a controversa “caça enlatada” vem chamando a atenção de grupos defensores dos direitos dos animais e dos legisladores sul-africanos. Fazendas criam animais selvagem apenas para serem abatidos por caçadores no que é um dos negócios mais lucrativos da África do Sul.

Recentemente, o Congresso Mundial de Conservação — que reúne representantes de governos, ativistas, cientistas e empresários — pediu que atividade seja banida. Por outro lado, os donos das reservas afirmam que suas fazendas são uma alternativa à caça ilegal de animais selvagens e ainda auxiliam na manutenção da espécie com reproduções em cativeiro.

Em 2013 um documento apontava que restaram apenas 645 leões em estado selvagem na África Ocidental e Central. Afirmando ainda que a espécie já estava extinta em 25 nações africanas, correndo o risco de extinção em outras dez, os números não melhoraram muito desde então, e a ONU declara que os leões africanos tiveram uma redução de 40% em apenas 20 anos.

Nesse contexto, é fácil entender como A Menina e o Leão consegue comover sem fazer muito esforço. O diretor Gilles de Maistre tenta conscientizar e entreter, mas parece não se esforçar o suficiente para elevar a produção, entregando assim um filme mediano que apesar de abordar temas interessantes não faz muito barulho.

O pequeno Kimba

Mia Owen é uma garota de dez anos de idade que tem sua vida virada de cabeça para baixo quando sua família deixa Londres para administrar uma fazenda de leões na África do Sul. Sem amigos e isolada do mundo, Mia está cada vez mais rebelde, até que um lindo leão branco, Charlie, nasce na fazenda.

Mia reencontra a felicidade e desenvolve um vínculo especial com o filhote, no entanto, quando Charlie chega aos três anos, a vida de Mia é abalada mais uma vez quando ela descobre um segredo perturbador. Perturbada pelo pensamento de que Charlie poderia estar em perigo e sem saber em quem confiar, Mia decide guiar o animal até uma reserva, na qual ele poderá viver livre.

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 Menina e o Leão pode ter problemas (mais técnicos do que em termos do trabalho do elenco), mas aos poucos vai se tornando um filme completamente capaz de entregar emoção e reflexão através da jovem Mia (Daniah De Villiers) e do leão branco Charlie. Boa parte da execução crível desta amizade se dá por conta da produção ter sido realizada ao longo de três anos, tempo suficiente para um elo entre a atriz e o animal selvagem ser criado.

A trama não é nada inovadora e é executada de uma maneira ineficaz. O espectador é jogado no meio da história, que tem pressa em apresentar todos seus personagens, mas não se preocupa criar contexto para tudo e quem mais sofre com essa pressa é justamente o relacionamento de Charlie e Mia.

O ponto central da trama é justamente como os dois criam um vínculo que, supostamente, supera até os instintos mais selvagens do animal. No entanto, para o espectador é difícil aceitar que tal relação floresce tão espontaneamente como sugerido pela montagem do filme. Saltos temporais mostram o felino indo de filhote a jovem adulto minando todo o desenvolvimento de Mia e da própria família que desenvolve tramas paralelas importantes.

Sem muita explicação descobrimos que o irmão mais velho de Mia tem problemas psicológicos — lutando contra ansiedade —, enquanto a moral do pai passa a ser questionada por conta de seus parceiros comerciais. Como tudo é apressado, e o foco é quase que exclusivo em Mia e Charlie, nunca desenvolvemos a devida empatia pelos demais personagens.

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A menina e o leão baunilha

Independentemente, há de se louvar o trabalho da jovem Daniah De Villiers (que interpreta Mia), O filme foi rodado ao longo de três anos para que a garota tivesse tempo suficiente para de fato desenvolver uma ligação com o animal. Supervisionada por Kevin Richardson — famoso e controverso sul-africano criador de leões e outros animais selvagens — as interações entre De Villiers e os animais são genuínas e o ponto alto do filme.

Mesmo com um palanque medíocre a mensagem permanece forte!

A Menina e o Leão não possui grandes qualidades técnicas, a fotografia não explora em nada os exuberantes cenários africanos, a trilha sonora é pouco inspirada e até mesmo o elenco — que conta com a excelente Mélanie Laurent (Bastardos Inglórios) — é subutilizado. Mesmo assim, sem qualquer esforço, ainda temos um filme para toda família que passa uma mensagem forte sobre a situação dos leões e outros animais selvagens em risco de extinção.

Crítica do filme Vingadores: Ultimato | Um espetacular e glorioso fim

Finalmente o aguardado “Vingadores: Ultimato” chegou às telonas, continuação direta de “Guerra Infinita” e o ápice do popular gênero “filmes baseados em quadrinhos”. As expectativas eram altíssimas, exatamente tudo que um fã dos filmes da Marvel poderia sonhar foi entregue.

São três horas de pura adrenalina bombando no coração sem deixar de lado a solução dos mistérios deixados em aberto, as consequências de tudo que já aconteceu, diversas referências às histórias em quadrinhos e a conclusão dos arcos dos heróis mais queridos da atualidade. O único spoiler necessário é: prepare-se para uma montanha russa de emoções.

Difícil falar que um filme é perfeito, principalmente porque é impossível agradar uma legião de bilhões de fãs, então com certeza "Ultimato" não é livre de defeitos. Porém, essas falhas estão sobre camadas de personagens carismáticos e efeitos visuais grandiosos que viabilizam transcender esses pequenos detalhes em um filme titanicamente épico e imensamente satisfatório.

Como lidar com a perda?

“Ultimato” prometia ser a complexa conclusão histórica da última década em que investimos emocionalmente em super-heróis e entrega exatamente o que prometeu. O filme começa relembrando as consequências do estalo que Thanos deu usando a Manopla do Infinito, em uma sequência que poderia ser apenas mais uma “cena pós-crédito”, mas que dá o tom exato para o longa: mostrar como cada personagem lidou com as perdas e como seguir em frente depois de algo tão avassalador. Metade do universo se foi e cabe aos Vingadores resolver o problema.

Diversas teorias foram formuladas pelos fãs, expectativas altas, trailers que mostram apenas os 20 minutos iniciais, e novamente os irmãos Russo conseguiram provar que nada é tão óbvio quanto parece. O cuidado com a narrativa é uma forma de agradecer aos fãs que passaram os últimos 11 anos acompanhando essa história, além de aproveitar para inserir momentos icônicos dos quadrinhos da forma mais inusitada possível. É extremamente emocionante e as lágrimas vão se mostrar diversas vezes, tanto de alegria quanto de tristeza.

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Assim como “Guerra Infinita” e “Guerra Civil”, “Ultimato” é dirigido por Joe e Anthony Russo, com roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely. A trama é bastante intrincada, tornando-se ainda mais complexa ao decorrer do filme. Raros são os momentos em que é óbvio como a situação será resolvida ou se ao menos será resolvida. A sensação de que tudo pode acabar dando errado é constante, suspendendo a crença de que o filme está ali para concluir com um final feliz, pois talvez nem seja tão feliz assim. Porém, é extremamente impressionante e satisfatório.

Embora o filme inclua muitos personagens “menos relevantes” da Marvel, como Rocket, Homem-Formiga, Máquina de Combate… “Ultimato” foca muito nos Vingadores originais. Além da batalha final contra Thanos, temos Homem de Ferro, Capitão América, Viúva Negra, Thor, Hulk e Gavião Arqueiro em arcos de história pessoais com ricas narrativas, adicionando ainda mais emoção e sentimentalismo para um filme que já seria robusto o suficiente sem isso.

No decorrer do filme, cada um desses personagens passa por uma jornada transformadora, nem todos para melhor. Alguns lidaram bem com os problemas, outros se voltaram para os lados mais sombrios do ser humano, mas após mais de uma década acompanhando esses heróis, é muito gratificante e emocionante ver tudo isso acontecer. Infelizmente não poderei tratar com mais profundidade desse assunto para evitar spoilers, mas basta dizer que vale muito a pena.

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Grande parte desse sucesso deve-se aos atores que encarnaram totalmente seus papéis, e em “Ultimato” eles entregaram a melhor performance de todas. Robert Downey Jr., Chris Evans, Scarlett Johansson, Mark Ruffalo, Chris Hemsworth e Jeremy Renner brilham sem esforço. Vale mencionar também Karen Gillan como Nebulosa, Josh Brolin como Thanos e Paul Rudd como Homem-Formiga, que dão um show a parte. É de se esperar que nem todos os personagens tenham o tempo de tela merecido, mas basta lembrar que a Marvel tem planos para mais séries e filmes com os personagens que aparecem pouco, então nada aqui é feito sem propósito.

Custe o que custar

Se a ambiciosa narrativa de “Ultimato” é o que torna o filme tão impactante, é também responsável por alguns tropeços. Há momentos em que a trama se resolve de forma muito conveniente ou com poucas explicações em comparação com o resto da história, mas tudo é facilmente relevado. “Ultimato” é claramente focado nos fãs, todas as referências e lembranças dos filmes estão ali pelo simples propósito de recompensar quem adora esse tipo de filme. É fácil elencar os momentos mais emocionantes, as aparições de personagens tão queridos e momentos tão marcantes, mas será muito melhor ver do que apenas saber.

Nada disso seria possível sem a maestria técnica que o longa possui. Foi necessário um malabarismo para contar cinco ou seis histórias simultaneamente sem deixar todo mundo confuso, os irmãos Russo juntamente com os editores precisaram porcionar cada momento para sempre ficar aquele sentimento de tensão no final de cada sequência, para culminar num climax de tirar o fôlego e arrancar lágrimas até mesmo dos espectadores mais frios e calculistas.

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A música de Alan Silvestri é parte do espetáculo, não apenas ampliado o caleidoscópio emocional do público, mas prestando respeitável homenagem a todos os outros compositores dos filmes do Universo Marvel. Os efeitos visuais, de transformações físicas até recriações digitais, são incríveis e servem para enaltecer ainda mais a narrativa e a experiência de Ultimato como um todo.

Avante Vingadores!

Após 11 anos e 21 filmes, “Vingadores: Ultimato” é muito mais que apenas um filme. É uma experiência pessoal. Funciona como um filme individual, mas com certeza é o ápice de uma construção cinematográfica colossal, a peça final de um quebra cabeça gigantesco em que todos nós colocamos uma peça.

A tradicional cena pós-crédito não foi incluída, marcando assim um futuro misterioso (se desconsiderarmos o calendário de produções da Marvel), mas pela constante evolução das histórias, as dicas deixadas no filme e o inevitável sentimento de "quero mais", podemos esperar produções diversificadas e cada vez melhores.

Desnecessário dizer que assistir um filme desse porte no cinema é mais do que aconselhável, é praticamente obrigatório. Esse é o final da Fase 3 da Marvel  (ou talvez seja “Homem-Aranha Longe de Casa?”), que agora possui o direito dos personagens da Fox, então patamares ainda maiores nos esperam no futuro desse incrível universo, e estaremos lá!

Crítica do filme Mal Nosso | Ora pro nobis

Considero qualquer cineasta brasileiro que se aventure a realizar um filme de terror na terra da “zorra total” um verdadeiro herói. Longe estão os dias de Zé do Caixão e sua trupe de amaldiçoados que conseguiam fazer o público olhar para os seus filmes mais pelo espetáculo do que pela produção em si.

Fazer terror no Brasil é muito fácil, pena que o mesmo não se aplica no cinema, e não faço aqui nenhuma critica as produções nacionais do gênero — que vem ganhando cada vez mais qualidade —, me refiro aqui ao mercado, e mais especificamente ao espectador, que parece não comprar a ideia. Mal Nosso, do diretor Samuel Galli, é um bom exemplo do bom cinema de terror brasileiro. Com uma proposta inteligente e uma mistura de subgêneros, o filme é sólido e bem amarrado, e que mesmo arrancando elogios da crítica especializada dificilmente chegará ao grande público.

Galli, que estreia na direção, apresenta uma visão inventiva para o bom e velho terror sobrenatural. Com a benção do “George Romero” brasileiro, Rodrigo Aragão — os miolos por trás de Mangue Negro, Mar Negro e As Fábulas Negras —, Mal Nosso é inteligente e uma escolha certa para os fãs do gênero.

Mensageiro

Arthur (Ademir Esteves) contrata um matador para executar um serviço. Sem poder recorrer às páginas amarelas, o homem se aventura pelos becos escuros da internet até encontrar Charles (Ricardo Casella) um serial killer empreendedor — afinal se ele vai matar porque não faturar uma grana também.

A história que já se desenrola com elementos intrigantes ganha um novo elemento quando descobrimos que o serviço contratado apresenta um componente sobrenatural. Aparentemente, Arthur é uma espécie de médium e sua ligação com o mundo espíritos lhe trouxe uma revelação sobre a chegada de um demônio ao plano terrestre.

É interessante descobrir como o filme navega entre o suspense psicológico, o suspense policial — com algumas pitadas de slasher — e culmina em um terror sobrenatural de marca maior. A estrutura diferente confere ainda mais estranheza ao filme — apesar de atrapalhar um pouco o fluxo da narrativa. A divisão pouco usual dos arcos cria uma ruptura muito grande entre as histórias, fato que prejudica o ritmo, mas que não compromete o enredo.

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Pega do escudo e levanta-te em minha ajuda

O grande problema de Mal Nosso são suas limitações “técnico-orçamentáis”. Fazer cinema no Brasil já é difícil, quando falamos de cinema independente as coisas ficam ainda mais laboriosas, mas se o assunto é cinema nacional independente de terror…

Samuel Galli faz uma bela estreia na direção. Apostando em um roteiro que mistura narrativas, quebra a linearidade e atravessa diferentes subgêneros do terror e suspense, Galli entrega um filme que realmente prende a atenção. 

A mudança de gêneros afeta o tom do filme, o que é interessante, mas mal executado. Nada que afete o filme como um todo, mas é algo que evidencia o fato deste ser o primeiro filme de Galli, que parece ter ainda muito mais talento para nos mostrar.

Crítica do filme Cópias - De Volta à Vida | John Wick perde a família e a moral!

Você já parou pra pensar que se não fosse a ciência a humanidade estaria fadada a uma expectativa de vida ridiculamente baixa? Sem os avanços da medicina talvez muita gente não chegaria nem aos 20 anos, afinal estaríamos a mercê de qualquer ameaça ao nosso frágil organismo. Assim, podemos dizer que o ser humano sempre deu o clássico “jeitinho” de trapacear a morte e prolongar seus dias na Terra.

Todavia, em nome de um código moral aleatório que segue os preceitos da bíblia (???), muitos avanços recentes foram freados para evitar que o ser humano pudesse “brincar de deus”. É o caso das pesquisas com células-tronco e das experiências com clonagem, que são alvo de críticas, mesmo que essas ideias pudessem salvar incontáveis vidas através de curas para doenças incuráveis.

É claro que as notícias que chegam até a gente podem não revelar toda a verdade e sempre pode ter algo acontecendo por debaixo dos panos, mas via de regra muita coisa leva décadas para acontecer de fato. Felizmente, nos filmes a coisa é bem diferente, sendo que podemos ter ficções que mostram as possibilidades de um mundo com esse tipo de avanço.

Esta é a base de “Cópias - De Volta à Vida”: um mundo com ciência avançada o suficiente para termos a possibilidade de transferir a consciência humana para robôs e também para testar uma biomedicina que desafia as leis da natureza. No centro da história, acompanhamos o neurocientista William (Keanu Reeves), que busca usar a tecnologia de sua companhia para recuperar sua família que morreu num acidente.

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A ideia não é nova, mas roteiros desse tipo costumam ter potencial. Ocorre que os resultados são desastrosos como experimentos com cobaias em um laboratório de baixo orçamento. O script preguiçoso não dá argumentos sólidos, o que abre espaço para inúmeros furos. Além disso, há diversas questões técnicas e de atuação que fazem o filme apresentar vários bugs.

Seria Keanu Reeves o novo Nicolas Cage?

Quem acompanha a carreira de Keanu Reeves sabe que o ator já teve altos e baixos, sendo que sua ficha tem títulos bem questionáveis, incluindo aí “Bata Antes de Entrar”, “47 Ronins” e “O Dia em que a Terra parou” (e isso só pra citar alguns), mas há também filmes marcantes como o icônico “Matrix”, “A Casa do Lago” e o recente “De Volta ao Jogo” (mais conhecido como John Wick para os íntimos).

Assim, com esses marcos, principalmente o mais recente “John Wick: Um Novo Dia para Matar” (e já temos o terceiro episódio, “Parabellum” quase saindo do forno), os fãs de Neo ficam ansioso a cada nova aventura do ator. Daí o porquê de haver algum burburinho para “Cópias - De Volta à Vida”, porém eu já deixo o alerta para baixar as expectativas se você é fã do gênero, porque não temos nada no nível de “Eu, Robô”.

Bom, realmente temos Keanu Reeves no filme, mas o ponto é que ele não é um ator incrível para filmes emocionantes e convenhamos que só pela sinopse já dá pra ver que não é algo fácil perder a família, já que isso realmente causa uma carga emocional. Todavia, assim como John Wick não ficou triste pela perda do cachorro (vamos dizer que ele ficou bem puto), ele também parece não ter emoções ao perder a família.

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Reeves mostra que é incrível em ser um robô, um ser tão superior que quase não consegue cair em prantos após uma tragédia. Talvez o objetivo do cara é competir com Nicolas Cage no jogo do sério... O roteiro mostra talvez uma única cena de choro e o cara fica de cabeça baixa porque ele deve ter vindo mesmo da Matrix, aí não sabe como expressar suas emoções. E é importante bater nessa tecla, pois ele leva o filme quase que sozinho, então é difícil não ficar incomodado com essa indiferença.

História inusitada que vira piada

Apesar da atuação fraca do protagonista, o filme “Cópias - De Volta à Vida” (aliás, esse subtítulo dá a impressão de uma continuação de “De Volta ao Jogo”, não?), talvez o maior problema aqui é justamente a sucessão de decisões inconsequentes do roteiro. É tanta coisa simplesmente jogada no script, que é perfeitamente normal a plateia começar a se questionar como alguém aprovou a verba pra fazer o filme.

E você pode estar achando que eu sou chato ou extou exagerando, mas eu não consigo aceitar o fato de os roteiristas empurrarem por goela abaixo uma indústria bilionária que não tem a mínima segurança para detectar roubos de equipamentos milionários (e isso só pra citar um único fato que joga os argumentos frágeis pelo ralo). Ok, o fator ficção tem lá seu valor, mas é tudo tão fácil que também fica difícil aceitar numa boa.

Aliado a esses fatos temos uma direção bem meia boca, que não faz questão nem de nos convencer nos principais atos. Ela funciona para uma ou outra cena mais básica, mas a gente espera algo bem mais grandioso para uma ficção que quer lidar com robótica e um futuro incrível.

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Fecha com chave de ouro os efeitos lá dos anos 2000, com robôs rudimentares e interfaces virtuais que já vimos similares em filmes como “Minority Report”. De novo, não é terrível, mas a somatória das mancadas deixa o resultado aquém do esperado, que é melhor esperar pra ver na Tela Quente ou na Netflix.

Talvez a única parte legal do filme é a abertura para o diálogo sobre essas tecnologias e os avanços da ciência. Enfim, eu queria dizer que “Cópias - De Volta à Vida” está entre os melhores, mas hoje é um grande não!

Critica do filme Atentado ao Hotel Taj Mahal | O exército dos justos

Em 26 de novembro de 2008, dez mujahidin do Lashkar-e-Taiba executaram 12 atentados em Bombaim, conhecida como capital financeira e maior cidade da Índia. O “11 de setembro” indiano, deixou mais de 190 mortos e cerca de 327 feridos. Dentre os locais dos ataques oito ocorreram no sul da cidade, sendo os mais relevantes o da estação ferroviária de Chhatrapati Shivaji Terminus (CST); o Leopold Café, um restaurante popular com turistas em Colaba; e dois hotéis cinco-estrelas, o Oberoi Trident, em Nariman Point, e o Taj Mahal Palace & Tower, próximo ao Portal da Índia. Um dos hotéis mais luxuosos do mundo, o Taj Mahal Palace ficou sob o domínio do medo por cerca de três dias.

A história é dramática, é assustadora, é real. Sem entrar em uma grande discussão ética sobre o valor de obras ficcionais que abordam temas tão sensíveis como ataques terroristas é fácil entender a origem da força narrativa por trás de Atentado ao Hotel Taj Mahal. Insensível ou não, a “hollywoodização” de tais eventos ajuda preservar a história, mantendo o relato vivo e aplacando eventuais revisionismos imbecis. 

Sob o comando de Anthony Maras, em uma estreia surpreendente atrás das câmeras, o filme acompanha os eventos de uma maneira intensa e íntima, que faz com que cada tiro atravesse a tela e atinja o espectador diretamente. Dev Patel, Nazanin Boniadi, Jason Isaacs e Armie Hammer encabeçam um elenco forte que transpira toda a tensão e o medo do fatídico 26 de novembro.

Atentado ao Hotel Taj Mahal é um filme forte. Intenso na sua dramaticidade e na cinematografia, a obra de Maras — que também assina o roteiro ao lado de John Collee — é um dos melhores títulos desse subgenero de thriller hisstórico, assim como Munique e Voo United 93, caminhando sem grandes dificuldade sobre a fina linha ética do respeito às vítimas.

Vá e faça jihad!

O roteiro de John Collee e Anthony Maras enfatiza os personagens em vez das ações. Assim, por mais imponente que seja a construção das cenas — e Maras realmente faz um trabalho soberbo com a câmera — o foco está sempre na humanidade. Por sinal, o roteiro faz questão de revelar algumas nuances dos terroristas, sem nunca permitir a total empatia por parte do público. O diretor nos apresenta aos monstros, mas deixa claro que esses são apenas emissários do mal. Servos descartáveis que são doutrinados e enviados para servir em uma guerra cínica.

Arjun (Dev Patel em ótima forma) é um garçom no Taj Mahal Palace Hotel — “onde o hóspede é Deus”, sob o comando do chefe de cozinha Hemant Oberoi (o lendário Anupam Kher de Doentes de Amor). Os convidados do dia incluem a herdeira muçulmana iraniana-britânica Zahra (Nazanin Boniadi, maravilhosa em todas as cenas) e seu marido americano, David (Armie Hammer, que agrade sem fazer muito esforço), com seu filho recém-nascido Cameron e sua babá Sally (Tilda Cobham-Hervey), bem como Vasili (Jason Isaacs no piloto automático), um o ex-agente Spetznaz (as forças especiais soviéticas).

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No caos que se seguiu, Arjun, David, Zahra e Vasili ficam presos no restaurante do hotel com vários outros convidados, enquanto Sally, alheia a todo o alvoroço, permanece com Cameron em seu quarto de hotel. O filme empilha tensão cena em cima de cena, sem deixar espaço para alívios cômicos ou momentos de enternecimento.

A história básica é complementada por essas tramas secundárias, dando muito mais corpo ao filme, mesmo que apostando em narrativas clichê. A família separada, o altruísmo do herói, as armadilhas do egoismo e, especialmente, o “perfilamento racial” (racial profiling) — a perigosa mistura de generalizações e estereótipos que eclipsam qualquer observação objetiva.

Com muita habilidade, Maras e Collee navegam por essas subtramas entregando um filme coeso e surpreendentemente ágil. Méritos também da direção de Maras que confere fluidez ao movimento da câmera conforme atravessamos os corredores labirínticos do Taj Mahal Palace Hotel. Misturando cinema de ação com uma cinematografia documental, Nick Remy Matthews, Maras e Peter McNulty transformam o majestoso cenário do Taj Mahal em uma armadilha claustrofóbica.

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Não há vergonha em sair

Atentado ao Hotel Taj Mahal é um ótimo thriller histórico. Com muita ação e drama, o filme de Anthony Maras apresenta um momento triste da histórica contemporânea. Sem entrar nas motivações por trás da guerra, o filme — acertadamente — foca mais no meio (os atentados terroristas) do que na mensagem (a ideologia de certos grupos radicais islâmicos).

Atentado ao Hotel Taj Mahal é um ótimo filme, mas que pouco acrescenta ao diálogo dos motivos por trás dos eventos retratados

O elenco excepcional, liderado por Dev Patel e Nazanin Boniadi, oferece dramaticidade na medida certa, sem cair no dramalhão. A violência é uma presença constante, bem como o seu reflexo nos personagens. A tensão e o cansaço é visível e cresce conforme o filme se desenrola, passando uma ideia real da passagem do tempo.

Apesar de abrir as portas para um diálogo muito maior sobre as motivações dos ataques, Atentado ao Hotel Taj Mahal se preocupa apenas em mostrar as peças e o tabuleiro, omitindo-se da difícil tarefa de definir quem são os jogadores.

Crítica do filme A Maldição da Chorona | Terror raso e choroso

Após cinco filmes de sucesso estrondoso, o universo de terror da Warner Bros. ganhou prestígio suficiente para que a gente possa considerar este o segmento “Marvel” da companhia. É aqui que temos o melhor coletivo de personagens assustadores que se unem num âmbito ímpar para compor um quadro maior de terror global, algo iniciado lá no primeiro “Invocação do Mal”, introduzido por James Wan em 2013.

De lá pra cá, este macrocosmo de sustos fugiu das clássicas investigações do casal Warren e passou a abordar as criaturas que permeiam as histórias deles. Agora, temos um filme que não se anunciou deliberadamente como um spin-off deste domínio, mas que inevitavelmente ligamos às histórias prévias pela presença de um personagem que já apareceu anteriormente em “Annabelle”.

Todavia, você que não viu os filmes prévios não precisa se preocupar, pois “A Maldição da Chorona” não faz questão de se conectar ao universo de assombração e se sustenta de forma independente. E, curiosamente, talvez a ideia de não ligar os pontos pode ter sido proposital, justamente para evitar possíveis reações negativas, já que este título se mostra bem aquém dos demais.

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Para você que não viu nada sobre o filme (até porque o marketing tem sido modesto), acompanhamos aqui a história de Anna (Linda Cardellini), uma assistente social que ignora os avisos de uma mãe suspeita de maus tratos aos filhos, mas que logo se vê ameaçada pelo mesmo mal que estava investigando. Agora, ela e seus filhos podem estar correndo um risco enorme por algo que talvez não seja apenas uma lenda.

Dos males, o menos assustador

Talvez o resultado de “A Maldição da Chorona” não seja bem o que muita gente estava esperando de um terror nos moldes de “Invocação do Mal”, mas é inegável que a Warner teve coragem em pegar um conto pouco conhecido para criar algo, no mínimo, inusitado. O resultado pelo menos é uma história inovadora para grande parte do público, então há boas surpresas no quesito folclore.

Esta é a adaptação de uma lenda mexicana, comumente usada para assustar crianças que não obedecem aos pais – nada melhor do que inventar contos para traumatizar crianças né?! A Chorona era uma mulher que por vaidade e vingança de seu marido matou seus filhos afogados e se suicidou no mesmo rio. Após sua morte, ela captura crianças para substituir seus filhos. Pois é, não faz o mínimo sentido, mas é isso aí...

Apesar de uma nova entidade, o script cai em clichês. Ok, há detalhes inéditos, mas, no todo, temos a velha história de uma criatura demoníaca que cisma com uma família e os protagonistas inocentes buscam uma forma de se livrar deste terrível mal. Assim, resta ao roteiro dar conta de nos surpreender pelos sustos e a resolução do problema, mas nada disso acontece e apenas embarcamos numa sequência de sustos em loop.

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Contudo, o que menos me incomodou nesse filme foi a falta de uma história criativa, pois eu já tinha baixa expectativa, mas um projeto produzido por James Wan me dava a impressão de que ao menos teríamos um terror mais psicológico. Não foi o caso. O terror em “A Maldição da Chorona” é raso, repetitivo e apenas barulhento. Som alto, cenas de close e aparições repentinas. Para não ser desonesto, apenas uma cena realmente dá calafrios, mas ela não salva o filme.

Tinha que ser o Chaves mesmo!

Desculpem a referência, mas é inevitável não atribuir parte dos problemas do filme ao diretor Michael Chaves, que tem aqui seu primeiro longa-metragem. A inexperiência é evidente em vários momentos, seja pela repetição de truques, pela falta de dinamismo ou mesmo pela abordagem pouco funcional, que deixa as cenas até meio esquisitas.

Enfim, o resultado é pouco inventivo e, novamente, só tomamos sustos pelo som alto, não pela direção que poderia ter explorado a vilã de forma mais inteligente. Novamente, para não ser injusto, eu acho que há algum mérito em algumas cenas, caso de um truque com guarda-chuva e uma ou outra cena em que o diretor aproveita as penumbras, mas nada excepcional.

Todavia, a fraqueza de “A Maldição da Chorona” não está só na direção, mas também é difícil levar a história a sério com tantos personagens incoerentes. Primeiro, temos o intercâmbio de uma demônia mexicana que vai até os Estados Unidos para assombrar uma família americana. Depois, os diálogos que misturam idiomas e fica tudo mais engraçado. E, para finalizar, temos atuações bem fracas de vários atores.

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O resultado não é catastrófico (felizmente!), mas falta criatividade tanto no roteiro quanto na construção da Chorona. A trilha sonora, os efeitos visuais e a maquiagem tentam compensar essas características superficiais, mas o resultado final é apenas mediano. Um filme de terror meia boca, mas que não alcança o nível do universo de “Invocação do Mal”. Enfim, não adianta chorar no terror superestimado!

Crítica do filme De Pernas Pro Ar 3 | O prazer da risada

A franquia De Pernas Para o Ar retorna às telas de cinema com o mesmo objetivo: ocasionar prazer através da risada. Com um novo olhar e direção de Júlia Rezende (Meu Passado Me Condena), as aventuras de Alice Segretto (Ingrid Guimarães) não perdem o ritmo cômico e dão espaço para temas feministas na obra. 

Com o sucesso da Sex Delícia, Alice faz um tour pelo mercado internacional de sex shop. Longe da família, o sentimento de saudades e de culpa por não participar da rotina e da educação dos seus filhos, faz com que Alice tome uma decisão inesperada: a sua aposentadoria ou, como alguns preferem, período sabático longe do trabalho.

No entanto, tudo vira do avesso quando um novo produto criado por Leona (Samya Pascotto), uma jovem empreendedora, conquista o mercado ao prometer trazer o prazer à distância.

A mesma receita com ingredientes novos

Provido de diálogos hilariantes, o terceiro filme da série é mais do mesmo. Sem nada para surpreender, o público continua acompanhando a trajetória da workholic Alice como empreendedora de sucesso no ramo de sex shop, que deixa a sua família em segundo plano.

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Longe de querer trazer algo novo, os conflitos de Alice giram novamente em torno do seu trabalho e a sua família, o que todos já esperam. Contudo, pautado no presente momento, o filme traz assuntos atuais, como a tendência do mercado digital e o sentimento de se sentir ultrapassado, o terror dos empreendedores do século XXI.

Nesta pegada, uma nova personagem surge na história, Leona, uma jovem empreendedora com uma visão inovadora sem medo de apostar em produtos digitais. Sem realmente agregar algo diferente para o filme, Leona é a versão workholic e bloguerinha de Alice nos tempos modernos.

Outro personagem que ganha espaço é Paulinho (Eduardo Melo), que invés de conquistar o carisma do público torna o seu papel cansativo e superficial, o que poderia ser a versão brasileira de Peter Kavinsky (Noah Centineo) no filme “Para Todos os Meninos Que Já Amei”, vira um garoto mimado sem nenhum atrativo. 

Um novo olhar

Apesar do terceiro filme não trazer novidades no enredo, é o primeiro filme da franquia a ser dirigido por uma mulher. Sob a direção de Júlia Rezende, que também fez parte da direção do seriado brasileiro “Coisa Mais Linda”, com a participação de Ingrid Guimarães no roteiro e a presença de mulheres na produção, o longa foge de comédias convencionais, que se utilizam da visão machista para fazer algo cômico.

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Longe de ser uma comédia estereotipada de duas mulheres com pensamentos diferentes competindo entre si, se converte para um filme prazeroso de assistir, especialmente para nós, mulheres. Sem querer perder tempo com intrigas que cansam e não ocasionam surpresa nenhuma, Rezende aposta na diferença de visão de mundo das antagonistas para exaltar a temática feminista, de forma leve e engraçada.

Dessa forma, a história traça dilmeas da mulher moderna e concretiza ainda mais a característica principal da franquia: o prazer de ter mulheres empreendendo.

Sem inovar na história, mas sem perde o lado cômico o terceiro filme garanta risadas e empodera ainda mais

Não satisfeitas de aumentar a visão feminina na produção da franquia,  a pré-estreia do filme em Curitiba contou com a presença de Maria Paula Fidalgo, que em entrevista para o Café com Filme comentou sobre esse novo olhar e direcionamento do De Pernas Para o Ar 3.