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Crítica do filme O Contador | Matemática e muitos tiros certeiros

Filmes de ação parecem atrair e manter seu público simplesmente por algumas cenas explosivas, corridas e tiros para todo lado. Alguns diretores buscam acrescentar uma história dentro dessa fórmula que apesar de batida, ainda possui espaço no cronograma anual das grandes produtoras, e principalmente no coração dos fãs.

Em “O Contador”, do diretor Gavin O’Connor, Ben Affleck interpreta Christian Wolff, um autista que tem problemas para entender o que as outras pessoas estão pensando, não sabe se relacionar direito por não entender as nuances sociais e é profundamente imerso em tarefas, sobretudo matemáticas, e entra em pânico quando é incapaz de terminá-las.

Essa combinação peculiar fizeram dele um excelente contador, trabalhando como freelancer para diversas organizações ao redor do mundo, incluindo alguns clientes envolvidos com tráfico e terrorismo. Mas apesar de suas capacidades extraordinárias, ele possui um transtorno obsessivo compulsivo que o obriga a manter absolutamente tudo ao seu redor de uma forma organizada.

Quando criança, Christian e seu irmão foram abandonados pela mãe, sendo então criados por seu pai, um militar que temia que seus filhos não fossem capazes de aguentar o mundo cruel. Para fortalecer as crianças, ele os deixa em um regime intensivo de treinamento de artes marciais com os mais conceituados mestres, transformando-os em verdadeiras máquinas de matar. Lembra um pouco uma história de origem de super herói, não?

Muitas contas e tiros na cabeça

Christian é contratado para analisar as finanças de uma empresa e descobrir um rombo milionário, onde conhece a contadora Dana (Anna Kendrick). Após entender em pouquíssimo tempo o problema, eles acabam se tornando alvos de um grupo de assassinos de aluguel.

Mesmo sem saber como demonstrar seus sentimentos, Wolff busca proteger Dana a todo custo, além de encontrar os responsáveis pelo dinheiro desviado. Em paralelo, dois agentes do tesouro nacional, Raymond King (J.K. Simmons), e a agente Medina (Cynthia Addai-Robinson), procuram descobrir quem é esse tal contador.

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Todo o filme é focado no Contador, buscando mostrar sua relação com o mundo, seu psicológico e suas escolhas. Basta dizer que Affleck está perfeito no papel, ou talvez apenas esteja se destacando como um ótimo ator. Christian Wolff  é um personagem que não sabe demonstrar muitas emoções, mas que é capaz de fazer contas matemáticas complexas de cabeça, e ocasionalmente mata qualquer pessoa com apenas um tiro certeiro sem nem piscar. O charme está exatamente nessa quase ausência de moral, pois as regras sociais não se aplicam aos seus atos, ele age segundo regras próprias, e tanto Affleck quanto o roteirista Bill Dubuque souberam criar algo bem interessante.

O filme recorre diversas vezes a flashbacks da infância de Wolff, o que acaba ficando um pouco maçante e quebrando o ritmo. Mas esse tempo é proposital, contribuindo bastante para a identificação com o protagonista. Então não espere ação desenfreada do começo ao fim, ainda que as cenas de ação compensem e sejam magistralmente executadas.

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Infelizmente, Anna Kendrick serve o papel clichê de dama indefesa, não convence muito como contadora, mas é uma pessoa adorável e contribui com doses de humanidade e emoção necessárias para compensar o distanciamento emocional de Wolff.

O final de “O Contador” é anticlimático e previsível, incapaz de fechar todos os arcos abertos na trama, mas no geral o filme possui ótimas cenas de ação e um “epílogo” que busca conscientizar sobre síndromes como a do personagem. Porém, acaba ficando superficial, já que o personagem é praticamente um super herói. Ainda assim, é bastante válida a escolha e construção do tema, e uma ótima adição aos filmes de ação.

Crítica do filme Inferno | Um símbolo despretensioso para a sua época

Quando foi lançado há 13 anos, o romance policial do escritor norte-americano Dan Brown, O Código Da Vinci, se tornou um marco na literatura mundial, e virou um best-seller em poucos meses. 

A temática ficcional que mistura suspense com religião chocou a comunidade cristã por propor uma história diferente de Jesus Cristo e de segmentos do cristianismo presentes na bíblia sagrada. Além disso, a linguagem fácil e estrutura de capítulos pequenos, divididos em duas ou três páginas, colaborou para propagar a fama do trabalho, tanto para bom, quanto para ruim. 

Após três anos, em 2006, tivemos a adaptação cinematográfica da obra, pelo diretor Ron Howard e grande elenco. A grande bilheteria, embalada pelo sucesso (e polêmica) do livro garantiu logo em 2009 a primeira sequência nas telonas, Anjos e Demônios – segundo livro sobre as aventuras do professor Robert Langdon – e também mais continuações literárias da franquia pela mão de Dan Brown. 

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Após esse salto de sete anos, Ron Howard e sua equipe de produção retornam para a terceira adaptação, dessa vez de Inferno, que é na verdade o quarto livro da saga, pulando o capítulo O Símbolo Perdido. De acordo com o próprio diretor, a escolha foi pela facilidade de adaptar o roteiro de Inferno, ao contrário de seu antecessor. 

A vida de Robert Langdon vira um Inferno

Se você não está familiarizado com o tema de Inferno, aqui vai uma breve sinopse. Ele é basicamente o mesmo dos outros filmes, focando na caça por segredos e antiguidades raras, porém com leves mudanças nos enigmas e obras de arte. 

Dessa vez sai o retrato da Mona Lisa e a andança no Vaticano pela correria por Florença e Istanbul. Os vilões também mudam: saem Opus Dei, Cavaleiros Templários e os illuminati para a entrada de... milionários ultrarradicais terroristas?!

O suspense integra a obra literária Inferno, do il sommo poeta da língua italiana, Dante Alighieri. Robert Langdon acorda num quarto de hospital em Florença, sem memória do que aconteceu nos últimos dias. A partir daí o professor se envolve em uma séria de confusões e planos mirabolantes para exterminar a raça humana com um vírus mortal, o qual só ele pode parar com seus conhecimentos sobre a obra magistral de Dante e sobre as entradas secretas nos museus italianos. 

Mesmo sem ter grandes nomes do circuito comercial, o filme tem uma boa equipe de atores. Tom Hanks retorna para o papel principal, ao lado de sua fiel companheira feminina, que dessa vez é interpretada por Felicity Jones. Os atores Omar Sy, Ben Foster e Irrfan Khan completam o rol de atuação principal. 

É interessante notar que o começo do filme empolga mais que o final. Ele busca se distanciar dos outros capítulos da franquia adicionando um ritmo frenético com cenas de ação sem explicação nenhuma, com a ideia de te puxar para o inferno próprio, sem fôlego e com muito suor. A mescla de cenas no presente com flashbacks aterrorizantes e obscuros do passado intensificam a proposta. E consegue o seu resultado, mas por pouco tempo. O início ‘quente’ dá lugar a um desenrolar e conclusão frios ao longo de 2 horas. 

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O inicial impactante vai se perdendo ao passar dos minutos, e logo se encontra na estrutura original das histórias de Dan Brown. Assim, a descoberta dos segredos do mapa do Inferno pintado por Sandro Botticelli acaba se tornando banal pelo desinteresse do próprio filme em si. 

O Inferno não é tão ruim assim

Salvo uma ou duas cenas de aula de história do prof. Langdon, na qual ele explica que o conceito atual de inferno vem diretamente da obra artística de Botticelli ou que o significado de quarentena remete à peste negra em Veneza, o longa não se encontra como suspense baseado em fatos históricos, ficando se balançando entre um blockbuster de ação e aventura de sessão da tarde. 

Se você é fã das aventuras do prof. Robert Langdon e de Dan Brown, Inferno é uma boa sugestão de entretenimento. Porém, para uma franquia que começou com a polêmica de questionar a divindade de Cristo e misturar religião com ciência, trazendo vários debates interessantes à tona, o terceiro filme da trilogia passa longe de se tornar qualquer ponto de discussão. Essa é uma história rumo ao ostracismo ideológico. 

Crítica do filme 12 Horas para Sobreviver | Violência é uma escolha?

E se, de alguma forma, um país inteiro concordasse em não cometer crimes de qualquer ordem durante 364 dias do ano para, em uma única data, poderem extravasar todo o seu ódio e seus instintos violentos e realizar toda e qualquer atividade criminosa - inclusive assassinato - sem serem punidos.

Esse é o princípio básico da trilogia "Uma Noite de Crime", que se encerra neste ano com o lançamento de "12 Horas para Sobreviver - O Ano da Eleição". Décadas antes, os novos "founding fathers" dos Estados Unidos decidem que esta é a brilhante solução para a acabar com a criminalidade na grande nação norte-americana.

Na noite do expurgo, você pode eliminar toda e qualquer pessoa que encontre, invadir casas, destruir patrimônios públicos e privados, machucar, torturar, estuprar ou matar. Tudo é permitido.

Bem, esse tema é explorado nos dois primeiros temas da franquia.Em "Uma Noite de Crime", acompanhamos a noito do expurgo sob o ponto de vista de uma família que está em casa e se vê vulnerável. Em "Uma Noite de Crime: Anarquia", os protagonistas ficam presos para fora de casa, na rua, e precisam se proteger dos malucos que saem às ruas para realizarem seu papel social de assassinos - inclusive o sargento Barnes (Frank Grillo), que sai para expurgar e acaba quase expurgado.

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Era óbvio que toda essa liberação ia dar merda. Uma verdadeira indústria do crime e novas formas de exploração começam a surgir. Empresas de segurança passam a enriquecer e a explorar seus clientes na noite do crime, seguradoras aumentam os preços na noite do expurgo, turistas de todos os lugares do mundo visitam os States somente para expurgar, num verdadeiro mercado turismo de assassinato (se no Brasil a gente tem até mesmo turismo de favela, por que nos surpreeder com isso?).

Nem todo mundo está contente com esse cenário e algumas almas com um pouco de  noção começam atividades ilegais para ajudar pessoas que são as mais atingidas pelo expurgo: pessoas pobres, que não têm como se proteger, grupos minoritários e vítimas de crimes de ódio que são as mais visadas como alvo.

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É nesse  contexto que a candidata à presidência Charlie Roan (Elizabeth Mitchell) começa a ganhar espaço, justamente tendo como grande proposta a eliminação completa da noite do expurgo.

O problema é que isso ameaça muita gente, e a senadora e candidata logicamente se torna um alvo disputado para a noite do expurgo. Quem vai protegê-la? O nosso querido sargento Barnes, que é convenientemente seu chefe da segurança.

Isso não é um treinamento

Conveniência é inclusive a palavra de ordem no filme, que decepcionantemente encontra saídas um tanto previsíveis e foge um pouco da linha dos anteriores. Quando uma falha no plano de segurança da senadora para a noite de crime coloca Barnes e Roan na rua em pleno expurgo, ambos acabam se encontrando repetidamente em situações sem saída.

E aí são salvos ou resgatados de formas tão improváveis que você até fica esperando o Liam Neeson dar as caras. É assim que entram também em cena os outros personagens importantes do filme, o comerciante Joe (Mykelti Williamson), seu funcionário imigrante mexicano Marcos (Joseph Julian Soria) e a black mamba ex-deliquente e atual ativista antiexpurgo Laney Rucker (Betty Gabriel).

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Assim como nos dois primeiros filmes, o grande ponto do roteiro é levar os protagonistas com vida até a manhã seguinte. Nesse caminho, "12 Horas para Sobreviver" explora o terror de uma vítima das noites de expurgo e o lado mais doentio e assustador da humanidade. Dessa vez, no entanto, com uma pegada um tanto "Sucker Punch" e mais teatral, mostrando lados mais ritualísticos dados à noite.

Terror constante

Na maior parte do tempo, o longa-metragem mantém um rítmo acelerado de fuga e perseguição e gente doida matando muito, embora eu tenha achado essa parte dos fatores inesperados mais forte nos filmes anteriores.

Dessa vez, os inimigos na maior parte são bem conhecidos e não meros estranhos, e as motivações são majoritariamente políticas (vou voltar a esse ponto em breve).

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Assim para manter um ritmo intenso e para criar uma atmosfera de medo e tensão, o principal fator usado pelo diretor é a trilha sonora, já que o roteiro acaba levando para momentos um pouco mais reflexivos e menos momentos na loucuragem.

O uso da teatralidade que comentei ali atrás também ajuda muito, assim como os movimentos de câmera, a câmera lenta e ouso de alguns excessos também são essenciais nesse sentido.

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"12 Horas para Sobreviver" não traz no elenco grandes estrelas de cinema nem nomes muito conhecidos. A maior parte é composta por artistas desconhecidos ou vistos brevemente em algumas produções hollywoodianas.

Sem dúvida, os destaques vão para os protagonistas Elizabeth Mitchell, conhecida pelas séries Lost e Revolution, e Frank Grillo, de "A Hora Mais Escura", que também fez ponta nos filmes da saga Capitão América.

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Não são atuaçoes fenomenais - eu particularmente acho que a Elizabeth Mitchell tem a mesma expressão em todos os papéis -, mas também ninguém deixa muito a desejar. São as essências dos personagens que não ajudam muito, já que todos são bastante clichês.

De maneira geral, não apenas as atitudes e o destino de cada um dos personagens, mas o filme todo é super previsível. Durante uma cena, você imagina "agora isso é que vai acontecer" e de fato ela acontece, porque o roteiro não sai daquela linha arroz-com-feijão de filmes que trazem essa mesma pegada.

Muito potencial, pouco esforço

Particularmente, gosto muito da franquia "Uma Noite de Crime" e enxergo um super potencial no plot desta sequência. Há uma infinidade de coisas que se pode explorar dentro desse universo e acho ótima a evolução da história escolhida pela produção: partindo de uma situação caseira, expandindo para as ruas e depois chegando a uma esfera política e global.

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Especialmente porque isso conduz o espectador a refletir um pouco sobre a própria natureza do ser humano e sobre nossas estruturas sociais de combate ao crime. Permitir a violência, ainda que por apenas uma noite, não seria uma forma de reduzir a criminalidade, mas sim de, de certa forma, "autorizar" a eliminação de populações que não teriam como se defender.

Será que ter uma noite em que tudo é liberado não incentivaria ainda mais a violência?

Será que existe, de fato, alguma forma de eliminar ou reduzir o comportamento violento entre os homens? A trilogia "Uma Noite de Crime" tem os recursos para despertar esse tipo de reflexão, mas infelizmente se concentra mais no andamento das cenas de ação do que nessa parte.

E último filme especialmente fica muito superficial, com o uso de tantos clichês, cenas convenientes e desdobramentos previsíveis. Ainda assim, vale a visita ao cinema, e especialmente o final do filme nos coloca em uma posiçaõ de reflexão que merece a atenção.

Crítica do filme Festa da Salsicha | Sexo e comida nunca foi uma boa combinação

Festa da Salsicha” é uma animação feita para adultos, mas isso não significa que as piadas desse filme não tenham saído de uma sala da 5ª série. Ok, talvez eu esteja exagerando, pode-se dizer que saiu da mente de um adolescente drogado, com os hormônios a flor da pele e uns fetiches estranhos por comida.

Como já era de se esperar, piadas infames como “meter minha salsicha no seu pão” são utilizadas o tempo todo, e esse é o resumo do filme. Alimentos em um supermercado esperando para transar. E se você não aguenta mais ouvir seu tio contar a piada do pavê, mas ri dessas piadas, parece que o jogo virou, não é mesmo?

Para ser justo, isso tudo foi imaginado por Seth Rogen, responsável pelo roteiro e ator de "Superbad" (2007), "Segurando as Pontas" (2008), "É o Fim" (2013) e "A Entrevista" (2014); então pode esperar uma comédia semelhante a esses títulos.

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Seth Rogen empresta a voz para a salsicha protagonista Frank, cujo objetivo é “entrar” no pão sensual Brenda (Kristen Wiig), mas existem regras e elas não podem ser quebradas. Acontece que os alimentos vivem num supermercado e diariamente cantam sobre o Paraíso — um lugar mágico onde eles finalmente vão para transar e viver plenamente. Obviamente essa é apenas uma ideia que as comidas têm do que acontece quando um humano, considerados deuses, os levam para casa.

E além disso, é necessário ser puro para ser escolhido, pois do contrário serão jogados em uma lixeira pelo deus furioso, que na verdade é só um adolescente entediado com seu trabalho. Eles vivem com essa esperança de um lugar sagrado fora da porta do mercado, mas tudo muda quando um pote de mostarda e mel (Danny McBride) é devolvido para as prateleiras, revelando que na verdade os deuses são sanguinários e que só querem comer os alimentos.

Ninguém leva muito a sério essa história, e continuam seguindo sua crença,  porém Frank fica desconfiado e parte em busca da verdade, e a partir daí toda a trama se desenrola, contudo sempre com o objetivo de entrar em Brenda.

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O elenco conta com nomes de peso como Salma Hayek, que dubla um taco lésbico chamada Teresa, Bill Hader como a cachaça anciã Aguardente, Paul Rudd como o faxineiro malvado Darren e James Franco como Druggie, um viciado em drogas que enxerga a quarta dimensão em que os alimentos têm pernas, braços e sabem falar. Jonah Hill faz a salsicha Carl, e Michael Cera dá vida a Barry, uma salsicha deformada que é peça chave para a conclusão da história.

A dificuldade em dublar adaptando

No Brasil, as cópias dubladas foram adaptadas pelos famosos humoristas do Porta dos Fundos. Infelizmente durante a tradução diversas referências, expressões comuns e trocadilhos são perdidos. Por exemplo, no começo temos uma excelente piada (insira sarcasmo aqui) de Hitler massacrando os judeus, mas o massacre de linguiças alemãs a caixinhas de suco fica sem sentido. Era um jogo com "jews" e "juice" (judeu e suco, em inglês). Outro exemplo é o “vilão”, uma ducha chamada Douche (gíria para babaca).

O filme é recheado de estereótipos raciais, isso é comum em comédias e as pessoas acham graça, legal. Mas um dos elementos chaves para descrever outras etnias é o sotaque, e na versão dublada mesmo com toda a adaptação milagrosa realizada pela equipe, acaba sendo toda resumida ao sotaque carioca.

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Então vale salientar que apesar do esforço e ótimo trabalho da dublagem brasileira, esse tipo de filme me parece melhor aproveitado na língua original.

Drogas são muito recomendadas para o consumo desse filme

Parece fácil imaginar que as piadas óbvias análogas a sexo acabem rápido, e isso não passou despercebido pelos brilhantes roteiristas. Em certo ponto, o filme questiona a religião de uma forma geral, obedecendo regras que não fazem sentido e que não são explicadas, intolerância racial e até mesmo homossexualidade. E indo mais além, a um niilismo resumido em uma orgia gastronômica e até metafísica.

Por fim, alguns vão gostar de “Festa da Salsicha”, e outros não. Comédia é algo subjetivo e nem todos podem achar graça em um pão que tem uma vagina na cara e fala por ela. Mas se você ri desse tipo de piada, vai amar o filme. E não há problema algum nisso, às vezes precisamos de um filme bobo sem muito propósito, e esse é definitivamente um deles.

Crítica do filme Assassino a Preço Fixo 2 | Ele voltou e continua a socar...

Quem gosta de filmes de ação certamente curte o ator Jason Statham. Ele é aquele cara da Carga Explosiva, da Adrenalina, da Corrida Mortal, da Redenção, da Espiã que Sabia de Menos...

Falando assim parece que ele é só um atorzinho, mas é bom esclarecer que ele é especialista em escalar montanhas, andar de helicóptero, queimar coisas, descer prédio correndo, andar de moto, entrar no rio, andar de barco, atravessar a ponte, metralhar o inimigo, atirar com a bazuca, atirar com a bazuca de novo.

É claro que você já viu tudo isso em “Assassino a Preço Fixo”, filme lá de 2011 que conta um pouco da especialidade de Arthur Bishop (Statham), um sujeito bem peculiar que mata geral e ainda finge que a pessoa morreu por acidente. Tem um serviço sujo e quer se dar bem? Bishop é o profissional que você precisa. Basta entrar em contato via WhatsApp...

Pois é, só que (OLHA O SPOILER AÍ GENTE) ele morreu no fim do primeiro filme ou ao menos fingiu para sair da visão de uns figuraças que queriam arranjar mais encrenca. Em “Assassino a Preço Fixo 2 - A Ressureição”, Bishop se escondeu no Brasil. Depois de umas aulas de português (sim, ele até arrisca umas palavras), ele ficou aqui curtindo as belas praias, o churrasco, o samba.

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Só que em tempos de internet, não dá pra ficar escondido e claro que alguém achou esse assassino tirando umas férias. Aí que ele recebe uma missão ainda mais complexa: liquidar três chefões do crime em pouquíssimas horas. Para piorar, a vida de uma mulher que ele acaba de conhecer está em risco, o que torna tudo ainda mais difícil e emocionante.

Transpirando testosterona

Se você já viu um filme do Jason Statham, certamente você já manja o que vai rolar em “Assassino a Preço Fixo 2 -  A Ressurreição”. É soco, porrada e muito tiro pra todo lado. É correria pra todo lado. É perseguição que não acaba mais. É tiro de pistola, de metralhadora, de rifle, de escopeta, de arpão. É explosão com granada, com bomba, com muita sensualidade.

Falando assim parece até brincadeira, mas o ritmo do filme é frenético. Do começo ao fim, Statham mostra toda sua virilidade para arrebentar muito bandido feio, salvar os inocentes, trabalhar no computador, armar arapucas, dançar, bater um papo, curtir a bela vista da praia, jogar um charme.

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O roteiro também ajuda muito para toda essa ação desenfreada, afinal, enfrentar três chefões do crime significa ter que dar porrada em muito capanga. O pau come solto no restaurante, na praia, no barco, nas docas, na prisão, no prédio. A receita é óbvia: escolha um cenário e coloque Jason Statham para detonar. E olha, que belos locais, até parecem papéis de parede do Windows.

O filme é insano, mas ainda bem que tem cenas em que dá para respirar um pouco. No meio dessa missão perigosa, Bishop conhece Gina (Jessica Alba) e aí como já dizia o Art Popular: “Jason Statham é um cara bem legal, pena que não pode ver mulher”. Se você pensa que ele vai se apaixonar e salvar essa garota indefesa (que na verdade era uma sargenta do Exército), você tem toda razão!

Statham mostra toda sua virilidade para arrebentar bandido feio e salvar a princesa

Jason Statham talvez não esteja em sua melhor forma, já que ele já assumiu papéis bem mais interessantes, mas até que tentaram dar alguma personalidade adicional para o personagem nesta continuação. É claro que isso não importa muito pra quem quer ver pancadaria, então o filme acaba acertando legal nesse tom de adrenalina sem fim. Como dizem, é um filme bom pra quem curte…

Falta fôlego e novidades

Dito tudo isso, acho que ficou bem claro que “Assassino a Preço Fixo 2 -  A Ressurreição” é mais um filme de ação com muitos clichês. A história é bastante simples, a narrativa é de fácil compreensão, há muitas conveniências para facilitar o desenvolvimento das cenas e não há grandes novidades.

Tudo isso é óbvio num filme desse tipo, mas nem todos os aspectos colaboram para o andamento das tantas cenas de ação. O filme acerta na maioria dos casos, porém algumas cenas podem ficar um pouco difíceis de entender. Talvez o problema seja mesmo o excesso de vilões ou pode ser que o diretor não tenha conseguido entregar exatamente o foco nos movimentos necessários.

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De forma geral, a produção dá a devida atenção aos mínimos detalhes, o que incluem um bom trabalho de figurino e maquiagem. Acontece que há também descuidos em outros pontos, como é o caso dos efeitos especiais, bastante recorrentes, mas que nem sempre entregam toda a realidade esperada. Não é algo gritante, mas uma produção desse nível poderia ter um capricho a mais.

As atuações do elenco são compatíveis com o roteiro, mas é claro que o destaque fica para a aparição de Tommy Lee Jones, que chega para dar uma revigorada num roteiro um tanto monótono e sem grandes perspectivas de comédia. Jessica Alba faz o papel de moça bonita, mas não vai além disso, algo que se deve também ao papel já cansativo de donzela em perigo.

A ação é incessante em cenários paradisíacos, mas o roteiro é tomado por clichês

Assassino a Preço Fixo 2 - A Ressureição” é um bom filme de ação e nada além disso. Se você quer ver lutas de qualidade, muita explosão e arrebentação, então esse é o título para você conferir neste fim de semana. Agora, se você quer história de verdade e boas atuações, vale optar por um título de ação mais diferentão, como “Sete Homens e um Destino”.

Crítica do filme No Fim do Túnel | Um roubo, um cadeirante e algumas surpresas

O cinema argentino vem conquistando cada vez mais espaço com produções de excelente qualidade em diversos aspectos, mas que se destacam principalmente pelos roteiros bem trabalhados. “No Fim do Túnel” é um suspense do cineasta Rodrigo Grande, que também assina o roteiro da película.

Todos os elementos apresentados servem para o desenvolvimento da história, alguns até meio óbvios, mas como um bom filme de diversas camadas, mesmo os detalhes óbvios são utilizados de forma satisfatória e surpreendente. Evitarei spoilers para não estragar a história, vou reservar um parágrafo para apontar alguns momentos da trama.

Informação é poder

Joaquin (Leonardo Sbaraglia) é um homem solitário e melancólico, que vive em uma mansão e é cadeirante, consequência de um acidente que levou sua esposa e filha. Sua única companhia é um cachorro que está em uma condição semelhante, paralisado e praticamente morto. Mas logo nos primeiros momentos, Berta (Clara Lago) aparece para uma visita, juntamente com sua filha que não fala e tem problemas para se relacionar com outras pessoas.

Joaquin havia colocado um anúncio para alugar o quarto o quarto do andar superior, já que  não podia mais subir as escadas e o espaço vago não estava sendo utilizado, então Berta e Betty (Uma Salduende) se mudam imediatamente, trazendo junto um pouco de energia para a vida deprimida de Joaquin.

Berta trabalha como stripper, mas só faz isso porque gosta de dançar e precisa criar sua filha. Ela tenta seduzir, distrair e animar Joaquin de diversas formas, enquanto Betty desenvolve afeição pelo cachorro que passa a reagir melhor com a presença da criança. Aos poucos ele vai cedendo e deixando seu bloqueio emocional para trás. Mas enquanto trabalha arrumando computadores em seu porão, acaba descobrindo que um bando de ladrões pretende roubar um banco cavando um túnel que passa por debaixo de sua casa.

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Então, com um equipamentos de imagem e som de altíssima qualidade, Joaquin acompanha todo o plano e acaba descobrindo que Berta, como já era de se esperar, é na verdade uma distração colocada pelo líder da gangue, Galetero (Pablo Echarri). Mas esse é apenas o começo de uma trama cheia de reviravoltas e revelações perturbadoras.

Atenção, os próximos dois parágrafos contém spoilers!

Apesar de muito bem construído, é preciso suspender algumas ideias para que o filme faça sentido. Por exemplo, não fica claro qual a motivação de Joaquin querer uma parte do dinheiro do roubo, correndo o risco de ser exposto e até mesmo morto.

Se a questão era o dinheiro, ele bem que poderia vender a mansão em que vive sozinho e está praticamente abandonada, algo apontado logo nos primeiros momentos do filme. Outro ponto que incomoda é a quantidade de recursos que ele possui, desde os equipamentos de som e câmeras até os “remédios” que ele utiliza de formas duvidosa, como as injeções que ele aplica em Berta diariamente.

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Do ponto de vista técnico, a película impressiona por tantos acertos. Os três ambientes principais, a mansão, o “porão” e o túnel foram construídos com ricos detalhes. Quase todo o filme se passa durante a noite, e o filme conta com um trabalho de claro/escuro que adiciona muita dramaticidade nos momentos de tensão, além de uma ótima produção sonora e ângulos de câmera ousados.

Como o núcleo não é muito grande, sobrou espaço para todos os personagens serem muito bem desenvolvidos. Destaque para as interpretações de Sbaraglia, que conseguiu encarnar um cadeirante com habilidades de McGyver e que fará os espectadores suarem frio em diversos momentos. Outra brilhante performance fica por conta de Pablo Echarri, com o vilão sádico e psicopata Galetero, com certeza a frase “traga o cobertor” nunca teve um sentido tão pesado quanto o que esse personagem impõe.

Se rastejar por esse túnel vai se sujar

“No fim do túnel” é uma excelente obra, mas alguns detalhes podem incomodar. Claro que esses apontamentos não vão estragar o filme em um contexto geral, mas vale a pena citá-los. Por exemplo, Joaquin toma algumas decisões importantes fora de cena, e suas escolhas só ficam claras para o espectador mais tarde e quase por acidente, mas nada que atrapalhe a história. Porém o final é especialmente frustrante, sendo resolvido da forma mais simples possível, quase que ingênua, distoando das diversas reviravoltas e revelações intrigantes durante o filme.

Outro momento que me pareceu desnecessário e de certa forma mal executado é a cena em que Berta resolve fazer uma “dança sensual” para Joaquin. Uma música estridente e nada sexy acompanha a dançarina em paralelo com outras cenas que não tem nada a ver com o momento, mas que são bem mais relevantes para o andamento da trama. Como dito, basta abstrair um pouco e seguir em frente.

Seguindo a tradição, infelizmente o filme vai estrear em pouquíssimas salas e por um curto período, mas é sem dúvida uma ótima opção para quem busca algo diferente dos blockbusters americanos, e com certeza vale o ingresso para quem conseguir encontrar um horário para assistir.